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Fabricantes, importadores, revendedores, lojistas e consumidores aguardam a volta do financiamento.

por M. Barthô

SÃO PAULO – Por enquanto, a crise economica nos Estados Unidos e seu efeito dominó na economia mundial não afetou bombasticamente as marcas de motocicletas, instaladas ou em vias de instalar-se no Brasil.

Mas o estrago desaqueceu fortemente o ritmo de vendas. Isso deverá atingir as fabricas no curto prazo. Afinal, quem não está vendendo ou exportando para de fabricar, desenvolver, investir. E coloca seus funcionários na rua.

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A crise atingiu os financiamentos, as lojas de motos e os consumidores. Nas indústrias, o estouro da bolha econômica forçou algumas férias coletivas aqui e ali e o replanejamento das metas de produção, a curto e médio prazos.

Como as industrias já tinham suas compras, investimentos e prazos programados com antecipação, no primeiro momento a crise não bateu forte nas linhas de produção. As atitudes e decisões dos fabricantes de duas rodas ficaram bem mais cautelosas, mas as marcas continuam otimistas e estudam alternativas para fazer suas motos chegarem aos consumidores.

Nas lojas é que a paulada foi realmente sentida. Os vendedores ficaram catando moscas ou esfregando flanelinhas nos tanques das motocicletas expostas por dias, semanas e, em alguns casos, por mais de um mês.

Sem o financiamento, bloqueado pelos bancos, os clientes desapareceram. MOTONLINE chegou a esse quadro após entrevistar vários fabricantes e lojistas do setor de duas rodas.

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Hoje, quem está praticamente abandonado com a moto usada na mão, o 13° na conta e os olhos brilhando é o consumidor. Ele espera com paciência que os bancos, esses “grandes amigões”, soltem o dinheiro e permitam movimentar as compras, vendas, trocas, revendas e aquisições de motos zero-quilômetro. Mas parece que o motoqueiro, o motoboy, o motociclista ou o motonliner vão continuar esperando por mais algum tempo.

Fábricas estão cautelosas Lá nas fábricas, em Manaus (AM), o entusiasmo que vinha crescendo em ritmo acelerado quase evaporou. Isso já era esperado.

No início do ano, os próprios diretores da Abraciclo ( entidade que reúne a maioria dos fabricantes nacionais de motos, motociclos e bicicletas) previram um desaquecimento de produção e vendas para o final deste ano ano. E, note-se: a bolha assassina ainda não havia explodido.

No primeiro semestre deste ano, a crise finalmente surgiu. A quase implosão da economia interna dos Estados Unidos espalhou-se como um tsunami para todos os cantos do planeta, lenta e inexorável. Devastadora.

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Inicialmente, a crise foi negada, ridicularizada, desacreditada, analisada, desmentida, esquematizada. Virou alvo de chacota presidencial. No Brasil, tornou-se apenas uma pedrada atirada contra uma forte couraça economica.

Mas a pedra chegou ao alvo. Primeiro atingiu o dólar, depois nas bolsas de valores, depois os bancos. E, claro, os financiamentos. Daí para as lojas foi um pulo.

“Faz quarenta dias que não vendo uma moto”, revelou a este colunista o dono da revendedora Motonac, Luis Sartori, uma das mais ativas revendas Kasinski da Capital paulista.

Alguns associados da Abraciclo, como Honda, Yamaha e Dafra, deram férias coletivas a seus operários nas fábricas de Manaus. Segundo o diretor executivo da entidade, Moacyr Paes, foram “férias parciais para recomposição de estoques”.

Paes está cauteloso: “Sabemos que está havendo dificuldades para os consumidores obterem crédito dos bancos particulares e das companhias financeiras. Tivemos uma reunião com nossos associados esta semana. Por enquanto, o assunto está sendo discutido internamente por cada um deles.”

Os fabricantes estão planejando que atitude tomar em cada caso. Eles analisam detalhadamente o perfil de seus investimentos, produção, fornecedores, distribuição, produtos e os consumidores de cada segmento de cilindradas, explica Paes.

Segundo o diretor, se por enquanto a produção e as vendas internas estão em compasso de realinhamento, a exportação foi afetada pelo sobe e desce das taxas cambiais das moedas das internacionais, do dólar e das bolsas de valores em todos os países.

“Os associados que têm maior índice de nacionalização em suas motos não sentiram tanto esse primeiro baque. Os que dependem mais da importação de componentes para montar suas motos é que estão sentindo”, diz Paes.

Nessa crise, as lojas de motos estão apanhando junto com as lojas de carros. Os fabricantes de veículos de quatro rodas ( autos, caminhões, utilitários, tratores ) que dominam ¼° do PIB (Produto Interno Bruto) nacional, também sentiram o baque — mas, como os fabricantes de motos, por enquanto a crise foi realmente sentida na distribuição de seus produtos.

Os representantes da Anfavea, associação que reúne as montadoras de veiculos de quatro rodas, foram bater na porta do governo com o chapéu na mão esta semana. E arrancaram dinheiro para movimentar o financiamento, as compras e vendas.

Segundo o presidente daquela entidade, Jackson Schneider, a crise provocou um visível impacto nas vendas.

“O governo federal liberou, através do Banco do Brasil e da Nossa Caixa, R$ 4 bilhões para os bancos e as financeiras ligados ao sistema interbancário. Através desse sistema o dinheiro vai de um para outro banco, particular ou estadual. Tive uma reunião com o presidente Lula, o ministro Guido Mantega e o governador José Serra esta semana. O valor liberado é para movimentar a venda e a troca de carros novos e usados”, declarou ele durante a reunião mensal da entidade.

Se a Anfavea correu bater nas portas do governo para agilizar o financiamento em seus pontos de venda, a Abraciclo ainda não foi.

“Infelizmente, esse dinheiro não está disponível para o mercado de duas rodas”, declarou ao MOTONLINE Moacyr Paes, da Abraciclo.

Busca de fórmulas O mercado encolhe como um todo quando as vendas ficam restritas. A crise afetou mais gravemente a compra da primeira moto, a popular, que puxa a fila e mantém saudáveis todos os fabricantes de duas rodas. Mas parece que ainda não amedronta as montadoras de motocicletas. Os fabricantes encaram o problema de diferentes maneiras e focam o bolso do consumidor, que perdeu as facilidades de aquisição.

A Kawasaki, por exemplo, que acaba de retornar ao País em grande estilo, declara que a crise é macroeconômica e não afeta seus planos para o Brasil.

“Nossos investimentos, que são próprios (US$ 4 milhões) não vão ser alterados. As motos representam apenas 28% da Kawasaki Heavy Industries, ou Kawasaki Industrias Pesadas. “A Kawasaki produz ferrovias, navios, petroleiros, portos e plataformas de petróleo, entre outras coisas”, diz o vice-presidente da empresa no Brasil, Kiyoshi Kuniy.

O executivo explica que a marca projeta montar e vender no Brasil cerca de 100 motos mensais de 250 cm³, do modelo Ninja 250, a um preço de R$ 30 mil cada, mais os modelos de quadriciclos e jet-skys. “São produtos que atendem quem busca veículos de lazer. Essa crise deverá atingir com mais intensidade as marcas que produzem e vendem mais de 10 mil motos por mês para uso diário, e não quem já está estabilizado na vida e depende de financiamentos totais do valor das motos.”

A indiana Mahindra-Bramont, outra recém-instalada fabricante de motos, que mira no público maior — os motoqueiros que usam motos diariamente — vê a crise como uma oportunidade.

“Não mudamos nossos planos de investimentos no Brasil. Vamos montar nossas motos de pequena cilindrada com crise ou sem crise”, diz seu diretor comercial, José Francisco de Oliveira Neto.

A AME – Amazonas, fabricante que, ao contrário de alguns rumores que circularam no mercado não vai ser vendida, está firme e acelerando a construção de sua fábrica. Para contornar a crise, a estratégia é procurar facilidades para o consumidor.

“A crise financeira fez reavaliarmos nossos planos, mas não nos fez desistir de nada. O principal atingido é o motoqueiro, que não está encontrando financiamento para tirar a moto da loja. É para ele que estamos estudando o que fazer”, diz Sthefano Deho, diretor de marketing.

Outras marcas consultadas pela reportagem, como a J.Toledo Suzuki, preferiram não se pronunciar.