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Muitas pessoas do universo editorial motociclístico estão adorando a invasão chinesa. Isso gera lucro, anúncios de uma ou duas páginas, dinheiro em caixa. Como a imprensa especializada é pequena e por vezes dependente, as opiniões ventiladas ao pé do ouvido raramente são publicadas. Ou são publicadas no estilo morde-assopra. Isso não ocorre com tanta facilidade, por exemplo, na imprensa européia. Lá uma revista mensal gorda publica um teste monstruoso com produtos do universo motociclístico e quando necessário desce o porrete sem medo. Capacetes, roupas, acessórios e mesmo motocicletas são criticados sem perdão quando tais críticas são merecidas.

Aqui no Brasil temos um universo de qualidade duvidosa em peças paralelas e outros produtos que, por serem grandes anunciantes, dificilmente são avaliados de forma crítica pela imprensa. Mas no Motonline é diferente. E vamos falar da China e dos chineses.

Estive por lá zanzando no começo do ano, tentando encontrar produtos de boa qualidade para o mercado motociclístico. E claro que sendo um observador arguto, não pude deixar de registrar certas impressões sobre motocicletas e motociclistas.

Esse aspecto da China me lembrou um país muito familiar.

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Mas antes vamos falar desse desconhecido País.

Muitos ficam embasbacados ao desembarcar naquele fim de mundo. Pessoas de visão estreita e limitada realmente acreditam que carros novos pelas ruas, pontes, túneis e shopping centers podem transformar a realidade de um país. Pura conversa mole. A China é e será por muito tempo uma ditadura pesada, com a mão de chumbo do Estado pesando na moleira do povão. Analistas medíocres acreditam mesmo que há na China um livre mercado. Mentira grossa. Por trás de qualquer empresa sempre encontramos na presidência ou na diretoria algum alto funcionário do partido comunista ou algum apadrinhado do Partidão de lá. Ou seja, uma economia estatal subterrânea, o governo parasitando o capitalismo e vice-versa. O pior dos mundos.

Esse ambiente fez surgir nos últimos anos uma super elite arquimilionária e uma massa de pobres diabos que assistem uma TV de conteúdo controlado, não podem navegar livres pela web e não contam sequer com uma assistência médica adequada. Tudo isso muito bem explicado por uma amiga minha, chinesa, formada em letras, gerente de uma grande empresa e que ganha 200 dólares por mês. E vale lembrar: Se você pretende fazer qualquer negócio, de alfinetes até jatos, você terá que engolir a China.

Tudo barato

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Realmente um dos fatores que barateiam o custo dos produtos chineses é a mão de obra barata. Mas há outros fatores que ajudam a baratear os produtos e que são fundamentais para entender o “milagre” chinês. O primeiro deles é que raramente (arrisco a dizer jamais) uma empresa chinesa paga royalties para fabricar esse ou aquele produto. Como o sistema jurídico chinês é impenetrável para o Ocidente, os chineses podem copiar sem medo, pois têm apoio e proteção irrestrita do Estado. Aliás, determinar onde acaba o Estado e começa a “iniciativa privada” já é um caroço.

No máximo o que uma empresa japonesa, européia ou americana pode fazer é se associar a uma empresa chinesa e tentar controlar minimamente a qualidade da produção. Um caso conhecido é a empresa chinesa HaoJue, a Suzuki chinesa por assim dizer. Essa parceria vem de longe e é o alicerce da Suzuki no mercado das pequenas. Seria interessante repensar o slogan daquela pseudo-celebridade nas propagandas da Suzuki…

Yes, Intruder e Burgman 125 são eminentemente motos chinesas, com um padrão de qualidade um pouco mais elevado por conta do cuidado que a Suzuki do Japão tem em relação a seus produtos. E para ser admitida em uma faixa de impostos vantajosa, essas motocas chegam aqui no Brasil sem algumas peças. Completadas aqui com escapamento, pneus, bateria e outros badulaques se tornam brasileiríssimas. Curiosidade: A Burgman 125 é conhecida na China por Rosie. Belo nome.

Um outro fator preponderante para o achatamento do custo chinês é a pesquisa e o desenvolvimento. Noves fora aquilo que é extremamente necessário, o chinês, sempre que possível joga o ônus do desenvolvimento nas costas do cliente.

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Enquanto empresas brasileiras, americanas, japonesas e européias gastam rios de dinheiro em pesquisa, o chinês fica de tocaia só esperando cair um protótipo em suas mãos. Só a Honda, por exemplo, possui três grandes centros de pesquisa e design ao redor do mundo. Torrance, na Califórnia, Abruzzo, na Itália e no próprio Japão. Foi dos estúdios de Abruzzo que saiu aquela maravilha que é a CB1000R.

Por aí podemos ter uma idéia do abismo que separa o universo motociclístico chinês do resto do mundo. Quando um fabricante chinês não é perfeitamente assessorado por uma equipe de experts estrangeiros, geralmente sai confusão.

Às vezes tenho engulhos quando ouço a estúpida frase: “O Japão também era assim”. Meus caros, comparar a indústria japonesa com a chinesa é como comparar o Brasil e o Paraguai. São parecidos em quase tudo…

Em poucos mais de 10 anos de existência a Honda mostrou ao mundo uma CB750 para calar a boca de todos. Yamaha, Suzuki e Kawa não ficavam atrás. Já no começo da década de 70 estavam abiscoitando títulos e ganhando das européias nas competições mundo afora. E no universo dos motores não há laboratório melhor que as pistas. São nomes que pensam, pesquisam e desenvolvem tecnologia motociclística. E claro, também fabricam. Alguém pode me dizer o nome de uma grande marca chinesa que está presente em algum grande campeonato?

Feio e lento

Todos aqueles que compram uma Yes ou outra chinesa se surpreendem com o desempenho pífio dessas motinhas. Ora, são motos chinesas. Mas como os chineses se relacionam com as motos? Entender essa relação ajuda a compreender nosso comportamento por vezes doentio quando montamos em uma moto. O arqueiro chinês não está preocupado em furar o alvo, já dizia Confúcio. A nobreza está nos ritos do arqueiro, e não no tiro. E o povo chinês tem essa calma confuciana… Esse é o jeito chinês de se pilotar. Lento, muito lento…

Para um chinês, o desempenho dessas maquininhas é mais que o suficiente, pois nos grandes centros essas motos estão confinadas a corredores específicos e nos bairros mais distantes não há necessidade de correr. Embora mais caótico que nosso trânsito, o chinês é muito mais seguro, pois eles andam mais devagar. E nesse quesito perdemos feio para o resto do mundo. Posso garantir por tudo o que vi por aí: Somos os piores condutores da face da terra!

No Brasil não aprendemos a conduzir veículos de duas rodas, alguns fulaninhos sequer pisam nos CFC´s (auto-escolas), basta uma propina e tudo se resolve. Depois, do alto de nossa ignorância condutora, corremos feito malucos. Somos metidos à besta. Claro que o resultado é um trânsito assassino onde o bom condutor não tem o direito de andar em baixa velocidade.

Em um universo urbano insano e doente, as motos chinesas realmente se sentem um peixe fora d´agua. Uma moto 125cc é moto para andar devagar. Quem compra uma 125cc popular e torce o cabo exigindo que a coisa chegue a 140km/h é, desculpe os termos, um idiota. Pensei em outros adjetivos, mas são impublicáveis. Agora se o nobre e veloz leitor acha que pode cobrar de uma 125 popular o desempenho de uma CBR125 ou de uma Cagiva Mito, aconselho-o também a fazer churrasco de casca de melancia. Oras, picanha e desempenho é para quem pode, não para quem quer.

Uma moto chinesa pode durar anos na mão de um chinês. Mas por lá o ritmo é outro, a tocada é outra.

E o pavimento é outro também. Infelizmente até nisso perdemos para os chineses. De modo geral, temos mais buracos e valetas. Isso arrebenta as chinesinhas que porventura não foram projetadas para o enduro das ruas brasileiras.

Pista fechada

Moto grande nem pensar! Na China, a maioria das províncias proíbe a importação de motos de maior cilindrada. E mesmo as pequenas fabricadas naquele país não podem circular por vias expressas ou auto-estradas. Foi necessário revirar o país para encontrar um bacana que tinha malocado uma Hornet 900 e uma ZX-6 no galpão de sua fábrica. Ele me explicou mais ou menos como conseguiu meter aquelas máquinas para dentro do País. Eu lhe expliquei que era um caso clássico de “Hot Back”. Agora o china deve estar falando para os amigos: “Donti uôli, ai lévi Lóti Beque”. Ou seja, o sujeito tinha costa-quente. Explicaram-me também que essa política de coibir o uso de motos é resultado de um lobby pesado das montadoras automotivas japonesas, européias e americanas. Chinês gosta mesmo é de um bom mercedão! Creio ser verdade, pois a corrupção no Partidão Chinês faz o Brasil parecer a Noruega.

Nas ruas principais só carros. À esquerda vemos o alambrado que separa o corredor das duas rodas

Nesse quadro onde a moto é meramente uma ferramenta, cujos anúncios na TV mais parecem propaganda de trator, onde vaso sanitário ainda é novidade burguesa, não há cultura motociclística e portanto o desenvolvimento fica empacado. Ai de nós quando os chinas resolverem fazer por conta própria motos esportivas ou big trails! Aliás já começaram! Visual de R1, 500cc e monocilíndrica. Uma fofura! O pepino é que se não há tradição, portanto não há experiência. Uma Yamaha ou BMW já sabem que determinada liga é mais eficiente que outra na confecção de um eixo, por exemplo. E quando a mesma Yamaha ou BMW pede para os chineses fabricarem um eixo de titânio, eles o fazem perfeitamente. Mas basta deixá-los sozinhos, sem referência para copiar ou um cliente para orientar que a treta começa.

Quando sugeri ao meu amigo chinês, o cara da Hornet, que ele deveria comprar um dinamômetro para desenvolver, testar e aferir os escapamentos por ele fabricados, ele riu na minha cara e respondeu: “Muito calo! Compla Aklapovique e manda pra mim e nós copia”. Sai de lá desanimado. Taiwan é bem diferente. 23 milhões de habitantes e 10 milhões de scooters. E são maquininhas de ótima qualidade que podem ser compradas a partir de 800 dólares, mais ou menos o salário de um balconista de fast-food. O Taiwanês pode até comprar uma GoldWing, mas aqui também vigora a proibição de motos em autopistas. Dizem a boca pequena que é lobby de montadoras…Atravessei o país de carro, ida e volta sem ver uma única moto na estrada. O policial rodoviário de BMW falou que em autopistas “motorbike forbidden”. E um grande empresário do ramo de motopeças me confessou: tenho 3 goldwings mas só posso mesmo dar uma volta pelas estradinhas secundárias…Que chato!

Geração internacional

Mas sinto que os tempos estão mudando. A geração mais nova de chineses já sacou que se não houver uma reação criativa por parte dos profissionais, designers e engenheiros, se eles não começarem a levar a sério as pesquisas e o design, no futuro eles não terão mais o que copiar. Isso já pode ser sentido em algumas áreas onde realmente fiquei embasbacado com a seriedade e a qualidade de certos produtos.

Essa geração nova já andou pelos Estados Unidos e pela Europa e sabem o que é bom. E claro, um incremento qualitativo e criativo tem seu preço. Foi assim com Taiwan, mais de 30 anos atrás, hoje referência em alta qualidade, desde o iPhone até peças e acessórios oficiais da Harley (dançou quem pensava que é tudo feito em Milwaukee) são fabricados naquela ilha. No futuro a produção pesada de cacarecos e produtos de baixa qualidade será transferida para o próximo da lista, Vietnan. Algumas empresas chinesas já terceirizaram seus serviços com este país vizinho.

Embora Hong Kong tenha sido “devolvida” à China, nos sentimos em outro planeta. O Governo Chinês não é bobo, e aos poucos vai transformando HK numa espécie de Mônaco da Ásia. Chinês povão ainda não pode entrar na Ilha. Esse rolo nem mesmo o pessoal de lá consegue explicar…

China-Brasilônia

O chinês não tem escrúpulos. Você pode orientá-lo adequadamente, pagá-lo bem e certamente você ficará satisfeito com a qualidade de sua encomenda. Não é à toa que famosas marcas de capacetes, européias e americanas, são todas silenciosamente feitas na China. Imagine entrar em um depósito imenso numa fábrica lá do interior da China e ver caixas e caixas com as mais famosas marcas de capacetes da Europa e dos EUA. E todas rigorosamente certificadas, dentro das normas internacionais. Mas se você pedir de cara o pior, o mais barato, o mais safado, o chinês fabricará sem pestanejar.

E é exatamente isso que alguns atacadistas, importadores e outros menos cotados estão fazendo aqui no Brasil. Escorados na desculpa esfarrapada “fazer o quê…é feito na China…”, estão trazendo o substrato do cocô do cavalo do bandido e vendendo caro para os trouxas aqui de plantão. Não bastasse a participação especial do querido governo que manda 90% de imposto numa enfiada só, alguns empresários acreditam que certos cacarecos podem ser vendidos com 400% de lucro. Ou seja, a qualidade ruim se justifica por ser “made in China”, mas o preço abusivo é tão brasileiro quanto a bossa nova…Garanto que o jogo de relação de uma Titan pode render entre 200% a 300% de lucro para um importador. Basta que seja um aço meia-boca e um acabamento pra lá de medonho. Por outro lado os mesmos atacadistas afirmam que o consumidor não quer saber de qualidade, só preço, desde o proprietário da Titan estropiada até o próprio-otário de uma Hornet que bota na cabeça um capacete de 40 reais. Isso sem contar os sacoleiros que entopem as lojas com produtos contrabandeados do Paraguai e Miami e ainda revendem nos conhecidos sites de negócios, que de tão livres são como um verdadeiro faroeste ou terra de ninguém. Esses são co-irmãos dos desmanches de motos. Todos colaboram para manter o mercado marginalizado, sem qualidade e sem um compromisso com o cliente. Faça um teste: Compre hoje um farol de xenon pelo “importabando da web “e daqui a 10 meses tente encontrar um reator de reposição, um chicote ou uma segunda via do manual. Ou tente ligar para o SAC. Ou se tiver problemas com garantia, tente apresentar a nota fiscal no Procom. O barato sai caro, mas lei do gérson é assim mesmo. O importante é levar vantagem, né não? Isso é fato. Escreverei sobre isso um dia.

Ser ou não ser…

A questão final é a seguinte: comprar ou não uma moto chinesa? Para responder essa crucial questão, aí vão algumas dicas: Se você se contenta com um desempenho honesto e vai andar tranqüilo de casa para o trabalho, a chinesa é a sua cara. Mas se você quer enrolar o cabelo no trânsito…bem, vai andar de ônibus, você não pode ter uma moto!

Fuja das marcas aventureiras! Ligue nas concessionárias e faça uma cotação de peças comuns como farol, painel, manetes, cabos, juntas e amortecedor. Se o vendedor vier com aquela conversa mole de contêiner preso no Triângulo das Cuecas, abra o olho.

Uma vez que você decidiu comprar uma chinesa fique atento à ativação da moto por parte da concessionária. Já vi coisas de arrepiar os cabelos, como tampa de válvula sair voando e moto sair da loja sem óleo.

Fique esclarecido quanto ao quesito garantia. Leia tudo e não deixe escapar nada. Lembre-se: É uma chinesa, não adianta tentar tocar como se fosse uma japonesa ou italiana. São motos limitadas em relação à ciclística e ao desempenho.

Use e abuse da internet para pesquisar sobre sua marca preferida. Não se deixe levar pelo preço, o barato sempre sai caro.

Leste selvagem

O mercado de motos para alguns é o oeste selvagem, a corrida do ouro. Mas tem um pequeno problema que algumas importadoras e montadoras (???) não estão muito preocupadas. Vejamos: vender moto não é o mesmo que vender produtos de R$1,99. Pense num balde de plástico ao lado de uma motocicleta.

O nível de tecnologia envolvida em tais produtos é radicalmente distinto e a responsabilidade de quem os vende também é. Acontece que determinados grupos endinheirados se perguntam onde está o filão de ouro do momento e descobrem que é o mercado de motos. Depois ficam encantados em saber que lá na China moto é coisa barata. Algumas bem mais baratas que outras. Pronto, ao invés de optarem por baldes de plástico, grampeadores ou meias, optam por motos, como se fosse tudo a mesma coisa.

Daqui a alguns anos muitos estarão chorando pelos cantos com micos sem peças de reposição, pois muitas dessas novíssimas marcas vão evaporar, como essas celebridades que estouram na mídia e depois somem sem deixar rastro. Já tentaram de tudo para empurrar as maquininhas no mercado. Uma empresa até batizou sua linha de chinesas com um elegante nome italiano. E muito vendedor gaiato empurrou frango xadrez no lugar de um bom risotto milanês. Quem comeu não gostou.

E o povão vai levando na lomba, afinal é melhor uma chinesa micada na mão do que quatro busão por dia.

Referência interessante: Se você ainda não cansou de ler, então esse artigo lhe trará mais informações sobre a economia chinesa:

http://portalexame.abril.uol.com.br/revista/exame/edicoes/0920/negocios /m0161653.html