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Por Luis Sucupira

Os números do trânsito no Brasil estão acima daqueles estampados em todas as guerras atuais. São 50 mil mortos e um exército de quase 100 mil aleijados total ou parcialmente, que passarão a depender da já combalida Previdência Social. Os hospitais estão cheios de acidentados e a maioria deles de motociclistas cuja culpa pelos acidentes é atribuída a eles. Acontece que nada se faz para mudar isso, nem campanha e nem educação de trânsito. Não há fiscalização e a coisa rola solta.

Os recursos do DPVAT são aplicados de forma ineficaz

Os recursos do DPVAT são aplicados de forma ineficaz

Certo dia me deparo com um comercial do DPVAT onde se explica que você tem direito a um seguro por conta de acidentes de trânsito. Na realidade o comercial diz que você não deve se preocupar pois o DPVAT paga as suas despesas e que você não precisa de intermediários (leia-se advogados) para agilizar o processo. E confesso que quase surtei.

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Amigos, assumir isso é assinar textualmente a incompetência do Estado e de todos os órgãos de trânsito ligados a ele no trato dessa epidemia de acidentes de trânsito no Brasil. O custo de um acidente de transito não se resume apenas ao pagamento do seguro. Ora, em vez de se realizar campanhas educativas, criam um comercial onde diz algo tipo – “Acidentes acontecem e se você se acidentar a gente paga a conta”. Paga? Ou nós motociclistas é que pagamos a conta?

Você sabia que nós motociclistas pagamos um DPVAT duas vezes mais caro que o DPVAT de um caminhão ou ônibus, que matam por atacado? Você sabia que você paga o DPVAT mais caro que de um carro? A justificativa é que moto é perigosa e toda aquela ladainha que estamos cansados de ouvir. Apesar disso não existem campanhas de educação de trânsito; ações de educação de trânsito e sequer ações de engenharia de tráfego voltadas para minimizar os acidentes.

O acidente de trânsito virou uma indústria muito rentável. Veja a quantidade de pessoas que ficam à porta dos hospitais visitando acidentados. Geralmente estão vestidos com camisas que trazem o nome ‘DPVAT’ e que são transportados em carros decorados de amarelo e preto com a marca do Seguro DPVAT usando um ícone representando uma pessoa acidentada.

Não haveria necessidade disso se o Estado cumprisse seu papel. Há verbas destinadas à educação de trânsito nos estados, mas elas retornam ao Governo Federal por falta de projetos. No máximo fazem comerciais fracos, idiotas, infantis e que não fazem nada a não ser queimar verba sem resultado. Sinceramente, vocês acham que alguém muda sua postura no trânsito apenas por conta de um filme de 30 segundos?

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Assista ao vídeo do governo sobre o Seguro Obrigatório DPVAT

Há anos insisto em provocar o debate visando obter apoio para a proposta de inclusão da disciplina de educação de trânsito nas escolas municipais, estaduais e particulares para crianças a partir dos 5 anos de idade, indo até aos adolescentes de 15 anos. A razão é simples: agindo assim estaremos preparando um pedestre melhor, um melhor motociclista e motorista, e com isso um cidadão melhor. Esta ação é fundamental para que em médio prazo tenhamos um trânsito mais gentil, menos egoísta e menos violento. Mas nada acontece por que é muito mais fácil aumentar o DPVAT das motos.

De nada adianta falar aqui de soluções pontuais resultantes de uma engenharia de trânsito inconsistente e incompetente, pois tais ações isoladas não resolvem o problema. É o mesmo que passar Merthiolate em ferimentos. Arde demais, mas não cura o ferimento. Pois é, o DPVAT da forma como foi anunciado está mais para propaganda de Merthiolate que para um fundo que ajude também em ações de educação de trânsito e formação de melhores cidadãos para o trânsito.

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Merthiolate, o terror das crianças de antigamente; ardia muito e não curava

Merthiolate, o terror das crianças de antigamente; ardia muito e não curava

Para quem é mais novo é importante saber que o Merthiolate acabou com a hegemonia do mercuro cromo, medicamento que pintava as nossas canelas e cotovelos de vermelho quando nos acidentávamos em nossas traquinagens infantis. O Merthiolate vinha com uma ‘pazinha’ de plástico grudada na parte interna da tampa, pronta para aplicar o líquido diretamente na ferida. Ardia feito fogo, mas não era melhor que a água com sabão que todo mundo tinha em casa. O DPVAT hoje é como o Merthiolate de ontem, parece uma solução, mas não é mais eficiente que água e sabão, ou seja, não cumpre sua finalidade. O Merthiolate da marca DPVAT não cura a falta de fiscalização e nem as possíveis fraudes que cortam fundo os recursos do sofrido contribuinte.

Há quadrilhas especializadas em fraudar acidentes para receber o seguro. Ficou surpreso? Pois fique sabendo que uma simples queda da própria altura pode virar um acidente com moto ou atropelamento para poder receber o Seguro. Infelizmente, amigos, no nosso país sem lei, com baixa ordem cívica e pouco progresso, existem brasileiros que agem corruptamente pois há a certeza da impunidade. Parece que o brasileiro perdeu a vergonha faz tempo.

O comercial do vídeo acima sobre o DPVAT é um desrespeito ao cidadão. Deveria ser educativo no sentido de evitar o acidente e não um filme que banaliza a morte de 50 mil pessoas e deixa um exército de quase 100 mil aleijados anualmente. É como Merthiolate: arde, mas não cura. Tem problema, não! Se faltar dinheiro eles aumentam o DPVAT das motos. Somos mais fáceis de ser penalizados. Afinal, para o governo, motoqueiro nenhum presta, moto não é solução de mobilidade urbana, a não ser para entregar a pizza deles mais rapidamente e o remédio na hora. Não farão falta, pois sempre haverá algum outro para substituí-lo.

Não somos carentes de leis, mas de atitude e autoridade. De soluções que ardem e não curam já estamos cheios.

Luís Sucupira
Motociclista desde os 18 anos. Jornalista e apaixonado por motos desde que nasceu.