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Para dar uma mãozinha, lá está o vendedor. Naquela loja, num lugar em que pessoas de todos os jeitos e de todas as partes vêm e vão – e raramente permanecem mais do que algumas dezenas de minutos -, não era diferente.

Alguém estava lá para, além de vender, orientar. E o nome dela é Tânia. Paciente, com um sotaque carregado, não ficava “em cima” como os vendedores sanguessugas ficam (e irritam!). Hora ou outra vinha dar uma sugestão, sempre lembrando para ficar à vontade. Se a jaqueta era impermeável, ou só resistente, procurava checar para informar corretamente. Levou a choradeira por descontos numa boa, propondo a condição que podia. – Se eu pudesse, parcelaria em 10 vezes, mas a máquina é programada para fazer até seis!

Mas fique à vontade. E a vontade levou até a ala dos capacetes, onde outro vendedor, também solícito, auxiliou. Mas logo Tânia estava ali novamente. Apoiada no sofá do ambiente, começa uma conversa informal. Num lugar onde a maioria dos que passam são viajantes, Tânia mora numa cidade da região, quase vizinha do local onde trabalha. Sem resistência, inocentemente, ela se entrega. Vive por ali, mas o coração está a milhares de quilômetros, provavelmente muito mais do que aqueles transeuntes anônimos viajam num final de semana, ou mesmo num mês. Ou ano. Baiana, Tânia mora no interior de São Paulo.

Deixou a família e o povoado onde morava, em sua terra natal (que talvez não conste no mapa), para tentar melhorar de vida no novo lugar, a convite de um tio. Ela só tem 20 anos. Explica que onde morava, a 800 quilômetros de Salvador, não havia “firmas” para trabalhar. As faculdades do local, públicas, são muito concorridas.

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E quem vinha da capital baiana é que levava as vagas, já que moradores, como ela, geralmente estudavam em escola pública, com preparação às vezes insuficiente para o vestibular. Mas ela já ficou na lista de espera. Esperou. E esperou. Essa é uma das faces do panorama que Tânia deixou para trás há um ano, quando veio pra SP. No novo lugar, trabalhava num restaurante, mas há um mês está na loja de acessórios para motociclistas. Não sei se Tânia guia ou já guiou uma moto. O certo é que, diante das alternativas que teve, guia a sua vida. Ao falar do futuro, por um momento seus olhos poderiam ficar marejados. Não ficam, mas ela desvia o olhar para o nada. Penso que involuntariamente ela se transporta para a Bahia, para a sua gente. Diz que quer visitá-los em fevereiro, e fazer faculdade, aqui. E quando se formar? Volta para a sua terra? Ou segue carreira aqui? – Depende. Só se algo me prender aqui. Por enquanto, o que prende parece ser só a necessidade.

Fala, saudosista, que de onde vem todos se conhecem e são muito unidos, apesar de a família não ser tão grande. Coisa que ela não vê em SP. E que provavelmente seus clientes, indiferentes, não se atentam. Muito menos os motociclistas, motoristas ou caminhoneiros que cruzam as movimentadas vias próximas dali, apressados em seu cotidiano.

Tânia consegue a última oferta: o preço à vista, no limite das seis parcelas que a maquininha permite. Deixa o seu cartão de visitas. Ali, as pessoas procuram por acessórios, por um complemento. Mesmo com sugestões, a escolha final deve ser unicamente do motociclista. E assim parece fazer Tânia, que só busca um rumo, um sentido para sua vida.