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Texto de Priscila Coghi

Fiquei em dúvida se deveria escrever ou não sobre o fato ocorrido na última sexta, mas valeu de lição para mim e espero que possa servir de lição para outros.

Saí com alguns amigos e fomos de moto para a Serra da Cantareira (Grande SP). Já era de noite. Apesar da chuva, subimos bem a serra. Paramos num bar muito gostoso, dançamos, cantamos nos divertimos muito até que por volta de 1:30, 2 horas da madrugada, não sei exatamente, resolvemos voltar. Descemos bem a serra, já havia parado de chover e a neblina estava apenas lá em cima. Tudo muito tranquilo.

Já na Zona Norte de São Paulo, no meio de uma descida, numa curva, havia uma armadilha, um bueiro fundo, com uma lombadinha antes e depois dele, o que dificultava a visibilidade e a noção da profundidade dele. O bueiro ficava no meio da faixa, exatamente na minha trajetória. Estávamos em baixa velocidade, pois logo em seguida tinha uma lombada eletrônica com limite de 40 km/h. Cenário perfeito.

Descida, curva, noite, asfalto não completamente seco, bueiro fundo camuflado no meio da faixa e foi assim que sofri meu primeiro acidente, causado por mim. Não sei dizer exatamente o que aconteceu. Eu estava em cima da moto, vi que tinha um buraco, segurei a moto e fui, pois como ele estava na curva, só vi em cima da hora. No segundo seguinte eu senti a lateral esquerda do meu capacete ralar um pouco no chão. Caí. Fiquei em choque. Caí? Caí. É, caí.

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Na teoria sabemos que ao subir numa moto, podemos cair e por isso eu não saio de casa para ir até a padaria sem jaqueta com proteção, luvas, capacete devidamente ajustado, bota com biqueira. Mas, faltava um item, a joelheira.

Na semana anterior eu quase comprei a joelheira, mas como meus gastos esse mês foram altos, resolvi economizar 62 reais e deixar para o mês que vem.  Afinal de contas, 4 anos que piloto, nunca cai, apenas uma vez me derrubaram parada no semáforo, então, não teria problema esperar mais alguns dias,  qual a probabilidade de sofrer um acidente nesses poucos dias? Praticamente nula.

Prepotência pura. Na verdade, não esperamos que isso vá ocorrer na prática. Meus amigos pararam as motos e foram me socorrer. Imagino o desespero que eles devem ter sentido ao me assistir caindo. Um deles disse que a roda da frente passou, mas quando a roda de trás foi passar, escorregou, saiu de lado. Eu e a moto fomos arrastados, eu na frente, a moto atrás de mim. Minha capa de chuva estava com diversos rasgos, as luvas e a ponta da bota, raladas. Meus joelhos doendo demais. De qualquer maneira, eu sentia que não tinha quebrado nada. Um amigo me levantou para me tirar do meio da rua. Sentei na guia da calçada, levantei a calça da capa de chuva, dois ralados enormes, ardiam. Entrei em choque. Olhava para os joelhos, olhava para eles, olhava minha moto, mas eu não estava ali, estava tentando entender o que aconteceu.

Quando todos estavam mais calmos, resolvemos que seria hora de retomarmos nosso percurso. Simplesmente subi na moto e fui. No automático. No meio do caminho parei numa farmácia pra comprar um analgésico, nem estava doendo tanto, só ardia, mas sabia que ia doer depois.

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Cheguei em casa, tomei o remédio e foi nesse momento que cai em mim. Eu caí. Eu sofri meu primeiro (espero que último) acidente de moto. Como que eu não desviei do buraco? Ele apareceu de repente, mas mesmo assim, eu deveria ter desviado. Como fui tão burra? E isso me transformou em frangalhos. A ferida da alma estava muito mais intensa do que as feridas em meus joelhos. Chorei, finalmente.

Conversei um pouco com meus amigos e dormi. No dia seguinte, sábado, eu precisava trabalhar. Tomei o analgésico e fui. Andei de moto 3 km pra ir e mais 3 km pra voltar, em desespero, pensando seriamente em trocar a bateria do carro, que está parado na garagem, e voltar a usá-lo, deixar a moto só para ocasiões especiais. Chorei mais um pouco.

Carlos Amaral em "balanceeê"..

Carlos Amaral em "balanceeê"..

Pra piorar, no domingo eu tinha o curso de pilotagem com o querido Carlos Amaral e eu já havia combinado com o outro grupo que iria. Não podia faltar. Eu estava relativamente bem. Os joelhos doendo, com a clavícula doendo, pois a moto bateu em mim, mas dava pra suportar com o remédio. O problema não era tanto o dano físico.

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E o medo de pegar a moto de novo? Precisava pegar grandes avenidas de São Paulo para chegar ao ponto de encontro combinado com o pessoal do grupo. Encarei, com muito medo, encontrei o pessoal e fomos. Claro, a cada buraquinho, desespero. Cada vez que via desnível ou algum carro se aproximar mais, me perguntava o que estava fazendo ali. Chegamos ao local do curso, o Amaral e sua esposa, Geórgia, sempre muito gentis e amáveis, o que me deixou um pouco mais tranquila.

O Amaral separou dois grupos e eu rezando baixinho para estar no segundo grupo. Foi o que aconteceu e eu já pensando em como iria burlar a aula, afinal de contas, eu já estava dolorida e com os joelhos machucados, se caísse de novo… Quando chegou a minha vez, fui bem devagar. Entrava nas curvas quase em linha reta. Não queria saber de ter que inclinar a moto. E a aula toda foi assim, travada.

Não conseguia me soltar, não conseguia aproveitar o prazer de andar de moto, minha moto não fazia mais parte de mim, só me perguntava o que estava fazendo ali. Mas aos pouquinhos eu fui vendo que conseguia, fui pegando um pouco mais de confiança e o último exercício eu fiz bem, sentindo a moto, no controle dela, sentindo novamente como parte do meu corpo.

O Amaral percebeu e me incentivou muito. Finalmente me diverti alguns minutos. Claro que ao voltar para as ruas, fiquei um pouco insegura ainda, principalmente quando avistava obstáculos, mas a paciência, a atenção e o carinho do Amaral e da Geórgia fizeram um reparo em minha alma.

Foi uma fatalidade, pode acontecer com qualquer pessoa, de moto, de carro, a pé, descendo uma escada ou atravessando uma rua. Meu corpo ainda dói, mas agora a consciência está mais desperta.

Mais uma turma do Carlos Amaral

Mais uma turma do Carlos Amaral

Equipamento de proteção é necessário e fundamental sim, todos eles! Não basta usar um ou dois, os locais desprotegidos provavelmente serão atingidos. Não apenas nas estradas, mas em todos os momentos.

Amaral, Geórgia, todos meus amigos que me apoiaram, muito obrigada! Não tenho palavras para descrever a gratidão. Vocês são sensacionais!