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Bike elétrica exposta numa loja de roupas em Munique, Alemanha

Bike elétrica exposta numa loja de roupas em Munique, Alemanha

Creio que a primeira vez que ouvi falar sobre bicicletas elétricas foi através de meu pai, faz muito tempo, quando ele testou uma “mobilete movida a motor elétrico que tem (tinha) força suficiente para subir um poste”. Faz 20 anos ou coisa assim. Nunca cheguei a ver a dita. Só fui ver pessoalmente uma bicicleta elétrica em 2007, a que está na foto, que estava exposta numa loja de roupas chique de Munique. Na mesma viagem lembro ter visto algumas poucas circulando pelas ruas de Munique e das outras cidades por onde passei: Paris, Barcelona, Amsterdam e e outras localidades Holandesas.

A primeira vez que me chamaram muito a atenção foi em Nova Iorque, por volta de 2010, principalmente pela forma completamente anárquica como eram usadas pelos entregadores de mercadorias. Para eles, a maioria de origem oriental, provavelmente chineses, não havia regra nem lei. Vinham de todo lado, de qualquer forma, em qualquer velocidade, e, não sei por que, todas com saco plástico branco cobrindo o selim. Uma verdadeira loucura. “Quando você compra uma (bicicleta elétrica) você ganha dois destes orientais malucos, para quando o primeiro ficar num acidente você poder continuar as entregas com o segundo”, brincava eu.

Não me interessei pelo assunto nem quando a Porto Seguro lançou, com muita propaganda, as primeiras elétricas “Made in Brazil”. Teria tido acesso a uma com certa facilidade, mas não quis.

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Hoje aqui em São Paulo já começa ser normal ver algumas bicicletas elétricas circulando. Homens de terno, mulheres bem vestidas, e até mesmo alguns esportistas de fim de semana pedalando na subida mais rápido que a gordura certamente permitiria. Sucederam as adaptações de motores 2 tempos em bicicletas normalmente de qualidade bem precária, que em sua maioria provavelmente rapidamente desintegrou – literalmente.

Já faz um bom tempo que o Reginaldo Paiva, Coordenador da Comissão de Bicicletas da ANTP, Associação Nacional de Transportes Públicos – http://portal1.antp.net/site/default.aspx – está cantando a bola, até bem pouco praticamente sem retorno, que a questão da bicicleta elétrica tem que ser vista com atenção e que urge fazer alguma coisa para organizar sua existência. Sei como é porque faz mais de 30 anos que grito pela qualidade da bicicleta no Brasil sem que praticamente ninguém dê ouvidos. Se a quantidade de gente que se arrebenta em bicicletas de baixa qualidade é absurda e não se faz nada, por que pular para o próximo tema, as elétricas? – Pensamento errado! Por que não tentar evitar um novo complicador, o próximo motivo para o caos? – Pensamento correto. Quem sabe as elétricas abrem as portas para a qualidade das bicicletas? Não custa sonhar.

E na última reunião da Comissão da Bicicleta da ANTP, que guardou um espaço especial sobre as elétricas, lá fui eu e dei com uma sala lotada de gente que sabe para o que veio e onde quer chegar, alguns bons representantes da sociedade civil, indústria e de seis cidades: São Paulo, Santos, Campinas, Sorocaba, São Caetano, São Carlos. E ai caiu minha fixa que o problema é maior do que meus olhos distraídos percebem. Ou se acerta agora ou teremos mais um veículo para confundir a lógica do bom senso.

Para todos está claro que urge a regulamentação das bicicletas motorizadas, tanto para controlar a qualidade do mercado como para estabelecer um padrão jurídico sobre o assunto. Está em jogo a definição legal do que é uma “bicicleta elétrica”, suas atribuições técnicas.

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A outra questão, também urgente, é que o pessoal da reunião diz que já há muitas reclamações de ciclistas que se sentem agredidos por (condutores de) elétricas, principalmente quando partilham a mesma ciclovia. Me faz lembrar a velhinha enlouquecida que circulava a milhão pelas ciclovias de Amsterdam numa cadeira de rodas de 2 tempos. Imagino que aqui no Brasil, com toda a ortodoxia dos ciclistas com relação a seus direitos (a tudo e contra todos), ser ultrapassado por um ciclista eletricamente motorizado deve causar ataques de irritações e fúrias. “Como pode?” “Tem que ir para a rua, com os carros…” “A ciclovia é nossa….”

Tirando os exageros e falando sério: não chegamos sequer a um mínimo de equilíbrio nas relações entre os automóveis, ônibus e caminhões e todo e qualquer modal de transporte que não seja motorizado. Muitos dos problemas desta novíssima safra de ciclistas são causados pelos próprios, mas justamente agora que a bicicleta está recebendo alguma infraestrutura é uma sacanagem permitir a invasão de outros veículos, desregulamentados e muito mais rápidos. A eterna inexistência do poder público como órgão regulador dos conflitos normais de uma sociedade pode fazer da bicicleta elétrica uma fábrica de tomates amassados. Cabe a sociedade civil propor e pressionar soluções.

Arturo Alcorta – Escola de Bicicleta