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Sangue bom por Geraldo Tite Simões*

O óleo é considerado o sangue da sua moto: quanto mais novo e limpo maior será a durabilidade do motor

Fotos: reprodução ..

Um dos temas que mais gera dúvidas entre motociclistas é o departamento de lubrificantes. Por exemplo, qual a diferença entre óleo sintético e mineral? O óleo sintético dura mais? Pode-se usar redutores de atrito? O que significa aquela sopa de letrinhas estampada no rótulo dos lubrificantes? Desde o óleo que vai no motor, até óleo de bengala, fluido de freio e óleo dois tempos, todos são focos de erros comuns e de preconceitos trazidos em função do uso em automóveis. Ainda existe um número grande de motociclistas que trata a moto como se fosse um carro de duas rodas, esquecendo-se de alguns itens exclusivos ao mundo da moto.

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Logo de cara, uma diferença técnica na embreagem entre carros e motos determina uma utilização radicalmente oposta. Com raras exceções, as motos têm embreagem multidisco em banho de óleo. Basta ver na ficha técnica para encontrar esta especificação em todas as motos japonesas e na maioria das européias. A exceção fica por conta da BMW e Guzzi. Por ser banhada em óleo, o mesmo que a gente coloca no cárter e lubrifica o motor, a embreagem torna-se muito mais sensível ao tipo de óleo. Umas das perguntas mais comuns entre motociclistas é sobre os chamados aditivos para motor. Justamente por conter na formulação componentes que são redutores de atrito, eles impedem o bom funcionamento da embreagem. O sintoma é a famosa patinada, quando o motor sobe de giros, mas a velocidade não aumenta. Portanto, nada de aditivos no óleo.

A dúvida campeã de audiência nos departamentos de atendimento ao consumidor das empresas produtoras de lubrificante diz respeito às diferenças entre óleo sintético e mineral. Poderíamos escrever páginas a respeito deste item, mas pode-se reduzir da seguinte forma: o óleo mineral tem características próprias e sua estrutura molecular original limita as alterações na sua composição. Desta forma, não é possível alterar de forma significativa seus parâmetros naturais de viscosidade, oxidação ou volatilidade. Já no óleo de base sintética, a formulação é toda criada em laboratório, utilizando inclusive base vegetal. Com isso pode-se alterar as características gerais, obtendo maior índice de viscosidade, maior estabilidade térmica, ponto de fluxão mais baixo, maior resistência à oxidação e menor volatilidade. Em suma, o óleo sintético tem maior capacidade de lubrificação em limites extremos de utilização da moto.

Neste ponto aparece um dos preconceitos mais comuns. Normalmente, os usuários de moto julgam que um limite extremo é sinônimo de alto desempenho, rotações elevadas, enfim, pilotar a todo gás. Só que, na verdade, o momento de maior stress do motor é na partida a frio.

Tudo começa quando a moto pára na garagem, ao final de uma jornada. O óleo ainda quente, escorre pelas partes internas e fica depositado no cárter, onde vai permanecer esfriando até atingir a temperatura ambiente e o motor ser acionado novamente. Aí começa o stress. Pela manhã, quando o motor for acionado, o óleo vai demorar algum tempo até ser bombeado por todos os componentes, sobretudo as partes altas – comando de válvulas, por exemplo. Neste momento o óleo sintético mostra-se mais eficiente porque o tempo necessário para preencher todo o motor é cerca de três vezes menor do que no mineral. Quem faz uso mais estressante do motor é aquele que roda pouco, apenas nos finais de semana, mantendo o motor desligado por vários dias seguidos; ou o contrário, como motofretistas que usam a moto diariamente, com muitas paradas.

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Fotos: reprodução ..

Respondendo às perguntas, o óleo sintético é efetivamente melhor para o motor. Porém, deve-se utilizar somente produtos destinados exclusivamente para as motos. Esta é uma observação importante, porque o óleo sintético para motor de moto é diferente do óleo sintético para motor de carro.

Com relação aos períodos de trocas, este dado é indiferente da composição do óleo. Em primeiro lugar deve prevalecer a recomendação do fabricante da moto. A diferença é que o óleo sintético mantém a capacidade de lubrificação por um período maior. Ou seja, quando o usuário for trocar o óleo, ele ainda estará com boas condições de lubricidade, enquanto o mineral já estará com suas capacidades reduzidas. Mas os períodos de trocas devem ser respeitados. Não vá na conversa de frentistas, que tentam justificar o preço maior do óleo sintético, alegando que “duram” mais. Isso é mentira!

Devemos lembrar que o mercado também oferece óleo sintético dois tempos, para ser misturado à gasolina. Como os motores dois tempos foram precoce e injustamente condenados por questões ambientais, geralmente o óleo 2T sintético é destinado às motos de competição. Mas quem roda de scooter ou com as 2T sobreviventes, têm neste produto algumas vantagens significativas, como a menor emissão de fumaça, maior capacidade de mistura à gasolina e redução na formação de carbono. Além disso, algumas fábricas acrescentam substâncias aromáticas que eliminam aquele cheiro desagradável de óleo queimado.

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Outros óleos Alguns motociclistas simplesmente esquecem que existem outros fluidos na moto. Os óleos esquecidos são os da suspensão dianteira e do freio. Os chamados óleos de bengala perdem eficiência quando submetidos a um stress muito grande (rodar constantemente por vias esburacadas) ou sob alta temperatura. Nas motos convencionais não é preciso alterar o tipo de óleo para se adaptar a um uso específico. Mas deve-se observar o manual do proprietário onde consta o período de troca do óleo. Sim, o óleo de bengala também precisa ser trocado periodicamente.

Já o óleo de freio só merece atenção quanto às suas propriedades. Alguns motociclistas que rodam de moto esportiva, sob condições severas, podem sentir o freio “borrachudo”, resultado do aquecimento excessivo do óleo. Neste caso é preciso alterar por um produto que atenda às normas mais exigentes. Na embalagem do óleo há a especificação DOT, uma norma criada pelo departamento de transporte americano. Em motos convencionais esta norma varia entre DOT 3 e DOT 4, sendo que o DOT 4 é mais resistente às altas temperaturas.

E para encerrar o plantão de dúvidas, outra que embaralha a cabeça de todo mundo é a famosa “posso misturar óleos de marcas diferentes?”. Desde que sejam da mesma especificação, sim, pode misturar as marcas. Mas se for de classificação diferente é melhor evitar a mistura. Agora, se for mudar a base mineral para base sintética é preciso trocar não apenas todo o óleo, mas também o filtro.

O livro sagrado de qualquer motociclista é o Manual do Proprietário. Nele pode-se tirar muitas destas dúvidas. O que não pode é o motociclista acreditar em alguns “conselhos” de amigos e até de algum vendedor despreparado. Se o ponto de interrogação persistir na cabeça, não vacile: recorra ao Manual.

Nocividade Por conter inúmeros produtos venenosos, carcinogênicos, tóxicos, irritantes e não é biodegradável, o óleo usado está automaticamente classificado como um “resíduo perigoso” e como tal tem de ser manipulado, escoado, recolhido, armazenado, tratado e utilizado de acordo com legislação específica. Além de ser um produto de elevado risco para a saúde, por contato com o corpo humano, o seu despejo na natureza constitui uma agressão ecológica violentíssima. Estudos eco-biológicos apontam que o contato de um óleo usado sobre o solo destrói a flora de uma tal forma que ela só se recompõe totalmente passados 15 anos. Os mesmos estudos indicam que o despejo de 5 litros de óleo usado sobre a água origina a formação de uma película oleosa com um diâmetro de 5 quilômetros. Os despejos nos esgotos provocam a inibição do sistema de depuração das estações de tratamento.

A forma tradicional de reutilização dos óleos usados tem sido a queima, aproveitando o seu excelente potencial energético. No entanto, a queima sem um pré-tratamento que retire as substâncias nocivas, só agrava o problema do impacto ambiental, pois é mais perigosa a poluição atmosférica do que a poluição dos solos e das águas devido ao despejo.

O fato de, simultaneamente, o óleo usado ser um resíduo perigoso e ter um potencial econômico, coloca a questão da sua reutilização de uma forma que seja aceitável e possa contemplar as duas vertentes, a saber, o escoamento não nocivo e a contribuição para a poupança energética de uma forma rentável.

Historicamente, as atividades de recolha e de reutilização eram limitadas e dominadas por pequenos empresários sem preparação técnica nem meios para um eficaz tratamento e, em vários casos, com poucos escrúpulos. O mercado paralelo de recolha e reutilização (sem tratamento) dos óleos usados foi e é dominado pelos chamados “sucateiros” que recolhem e revendem o óleo usado para queima, como complemento da sua atividade principal, a sucata metálica.

O incremento de vendas de lubrificantes nos hipermercados veio acentuar a tendência para a “auto-troca” por parte dos motociclistas, aumentando assim o risco de despejos na natureza. O atual quadro legislativo impõe regras que obrigam os utilizadores de lubrificantes e enquadram as atividades de recolha, armazenagem e tratamento dos óleos usados, as quais só podem ser desenvolvidas por entidades licenciadas para estes efeitos. A violação destas regras é reprimida por um leque de multas, ao incluir a figura de “crime ecológico”, e prevê a pena de prisão para os responsáveis. As formas previstas para o destino dos óleos usados são a sua reutilização (como combustível ou como óleos base re-refinados) ou a incineração, todas tendo de cumprir regras químico-ecológicas definidas. Deveres do usuário Quanto ao usuário individual ou coletivo de lubrificantes, é vedado qualquer despejo, sendo obrigatória a sua entrega a um recolhedor licenciado. O mais fácil é levar o óleo velho a um posto de gasolina que possua o serviço de troca. Lá, eles armazenam os resíduos para posterior reaproveitamento.

o Reutilização como combustível: Esta é a forma clássica de reutilização dos óleos usados. Afim de que o óleo usado seja aplicado para queima, ele é sujeito a um tratamento primário para extração da água e dos sedimentos.

o Re-refinação: Dado o elevado teor de hidrocarbonetos com cadeias moleculares dos óleos base, tem havido esforços esporádicos incentivados pelos governos de alguns países para a re-refinação e subseqüente re-incorporação das frações resultantes na composição de lubrificantes. Novas tecnologias de re-refinação têm vindo a ser desenvolvidas, com recursos a processos de tratamento com hidrogênio, propano e reagentes não-ácidos. Estes processos asseguram melhor qualidade dos derivados e formação de sub-produtos menos agressivos. No entanto, estes processos são onerosos e dificilmente amortizáveis e a sua implementação tem sido muito limitada.

De uma forma geral, a re-refinação que chegou a ter algum sucesso nos EUA e em alguns países europeus, sobretudo nas épocas das “crises de petróleo”. Há hoje uma retração no negócio, por envolver custos operacionais elevados que tornam esta atividade pouco competitiva face ao negócio dos óleos base virgens e, assim, está em retomada a tendência preferencial pela reutilização dos óleos usados como combustível.

o Incineração: Esta via destrutiva é utilizada, sobretudo, quando se verifica a impossibilidade de reutilização devido à presença de certos tipos e níveis de contaminantes nocivos.

*Fontes consultadas: Agip do Brasil; Valvoline, Galp – O contato de um óleo usado sobre o solo destrói a flora de uma tal forma que ela só se recompõe totalmente passados 15 anos – O despejo de 5 litros de óleo usado sobre a água origina a formação de uma película oleosa com um diâmetro de 5 quilômetros – Os despejos nos esgotos provocam a inibição do sistema de depuração das estações de tratamento

Sopa de letras As embalagens dos óleos trazem uma série de informações, algumas compreesníveis, outras totalmente enigmáticas. Vamos resumir as principais delas.

API (American Petroleum Institute), JASO (Japonese Automobile Standards Organization) e ACEA (Association des Constructeurs Européens d’Automobiles) são as três entidades licenciadoras de lubrificantes mais conhecidas para motos.

A API classifica os seus níveis de performance para motores de ciclo Otto (a combustão por centelha) como “S”. Atualmente, o nível API mais elevado é o SJ.

A ACEA determina a letra “A” para motores de ciclo Otto. Neste momento, o nível ACEA mais elevado para gasolina é “A3”.

A JASO – Japanese Automobile Standards Organization – define especificação para a classificação de lubrificantes para motores a dois tempos (FA, FB, e FC, em ordem crescente de desempenho).

A viscosidade exprime a velocidade com que um lubrificante flui a uma determinada temperatura. Trata-se de uma grandeza mensurável e expressa em unidades, das quais a mais utilizada é o Centistoke. Mas atenção! Não confunda viscosidade com índice de viscosidade.

O índice de viscosidade exprime a maior ou menor variação relativa com que um lubrificante altera a viscosidade com a alteração da temperatura. Exprime-se através de um número calculado empiricamente e não apresenta unidades. Um lubrificante com maior índice de viscosidade que outro varia menos de viscosidade com a alteração da temperatura. Em todo o mundo as viscosidades dos lubrificantes são classificadas em graduações SAE (Society of Automotive Engineers) diferenciadas para motores e para transmissões. As classificações SAE distingüem limites diferentes para viscosidades a frio (número seguido da letra “W”, de winter, inverno em inglês) e a quente. A tendência atual é para a utilização de lubrificantes multigraduados com limites a frio e a quente (por exemplo, SAE 15W-50 para motores).

*Geraldo Tite Simões é jornalista e instrutor de pilotagem e mantém uma coluna mensal na Revista MOTOCICLISMO

Tite
Geraldo "Tite" Simões é jornalista e instrutor de pilotagem dos cursos BikeMaster e Abtrans.