Quando se fala de economia de combustível em motocicletas é notável a evolução tecnológica que está incorporada a muitas motos presentes no nosso mercado. Hoje, há motos com motores maiores que consomem praticamente o mesmo que motos pequenas da categoria street, onde supostamente uma das características das motos aí enquadradas é (ou deveria ser) a economia de combustível.
O exemplo mais bem acabado disso é a Honda NC 750X. Durante o teste que fizemos, a NC 750X fez média de 25,16 km/l, com melhor passagem perto de 28 km/l. É bom destacar que rodamos perto de 1.300 km com a moto nas mais variadas condições de clima e piso, além dela ter sido conduzida por pilotos diferentes. Como se percebe, são marcas bem semelhantes com as que fizemos com motos como Yamaha Fazer 250, Traxx TSS 250 ou Honda CB 300.
Indo para a outra ponta desta escala, as esportivas se valem de toda tecnologia para entregar a esportividade que o consumidor deseja. Contudo, as restrições de emissões que hoje vigoram complicam bastante fazer uma moto “andar bem” como se diz por aí. E isso é agravado ainda mais se levarmos em conta o ponto de partida do aproveitamento da energia do motor à combustão, que é bastante restrito. Sabe-se que um motor de combustão interna aproveita menos de 40% da energia liberada pela queima do combustível e a relação km/litro de combustível reflete bem esse aproveitamento.
Se analisarmos uma superesportiva como a BMW S 1000 RR, por exemplo, vamos verificar um grande aumento nos equipamentos eletrônicos para atuar exatamente na configuração das respostas do motor às várias situações de pilotagem. Desde uma faixa de rotação mais ampla, com entrega limitada para maior segurança (modo Rain) até uma sintonia perfeita para a entrega total de todo potencial da moto, seja na potência do motor ou nos controles auxiliares da pilotagem, suspensão ativa, mapeamento do motor, controle de tração e ABS especial para competição.
Tudo isso está lá para auxiliar na resolução da complicada missão de oferecer a esportividade desejada em uma superesportiva que “anda bem” e conseguir cumprir as leis de emissões. O resultado de tudo isso é um consumo de combustível até razoável para essa classe de motocicleta. No teste marcamos o pior consumo em 15,21 km/l e o melhor ficou em 17,09 km/l, com a média em 15,93 km/l. Do ponto de vista da esportividade, as superbikes de hoje (RR) estão bem mais longe das “Racing Replicas” de alguns anos atrás, quando havia bem menos eletrônica e restrições de emissões. Na verdade, essas motos andam com mais dificuldade nas ruas hoje pois são mais preparadas para rodar nas pistas e consumir (muito) combustível.
Como diz o esclarecedor texto Cilindrada não é potência, do jornalista Geraldo Tite Simões, motor maior não é sinônimo de maior potência e da mesma forma, o deslocamento volumétrico de um motor, sendo maior, não significa que esse motor consuma mais, necessariamente. Pensemos juntos: num motor a explosão, a lógica diz que quanto menos explosões ocorrem, menos combustível é queimado e, portanto, menos combustível é consumido. Assim, um motor que funciona em rotações menores (rpm) deve consumir menos. Correto? Em princípio sim.
Porém, há muitos outros fatores como por exemplo: a relação entre diâmetro e curso do pistão e sua relação de compressão; o número de cilindros e sua disposição (“V”, em linha ou opostos); a forma de dispor o motor no chassi (transversal ou longitudinal) e a consequente configuração da transmissão; o funcionamento das válvulas no cabeçote (comando simples, duplo) e detalhes de seu funcionamento, proporcionando menos ou mais massa em movimento recíproco; a forma da câmera de combustão e seus dutos de admissão e exaustão; restrições e sintonia acústica desses dutos às frequências de ressonância do sistema de admissão e escape. Isso tudo sempre em função da faixa útil de rotação para a qual o motor foi pensado. A relação entre potência e consumo é bastante complicada e cada fabricante, em cada modelo de moto, procura uma formulação que proporcione melhor resultado para a proposta a que a tal moto se destina.
Esse é o ambiente em que os engenheiros trabalham para conseguir motores mais eficientes. Mas há muitos outros fatores para que se consiga uma eficiência energética que compensa. O peso da moto, por exemplo, é uma variável que tem muita influência no resultado final quanto ao consumo de combustível. Outro fator é um menor número de peças móveis e do atrito entre elas. Estes dois itens tem em comum a relação direta com o esforço que o motor deve fazer para transformar as explosões em força, necessária para movimentar a roda que traciona e empurra a moto para a frente. Daí conclui-se que menos peso e menos atrito nas peças em movimento representam melhor resultado do esforço do motor, que pode se valer de menos explosões e, portanto, queimar menos combustível, aumentando a eficiência energética.
Com a entrada da fase 2 do Promot 4, as emissões de escapamento estão mais restritas ainda e isso obrigou os fabricantes a aumentarem a intervenção dos sistemas de catalisadores nos escapamentos. O problema é que eles atrapalham sobremaneira a função de ressonância que aumenta a eficiência do motor. Além disso, nessa nova fase é preciso diminuir o excesso de evaporação da parte mais volátil do combustível para a atmosfera. E isso exigiu mais algumas mudanças nas motos para 2016. A Honda, por exemplo, utiliza uma tampa de combustível especial, com filtro e/ou válvula no seu respiro.
Outros fabricantes utilizam sistemas de evaporação controlada (canister) para ficar abaixo do limite especificado. Mas é bom ficar claro que o que mais interfere no funcionamento dos motores é o catalisador. É por isso que algumas motos tem aumentada sua capacidade volumétrica – a Honda CG 150 cresceu para 160, por exemplo. Essa é a melhor alternativa para manter o desempenho esperado e ainda assim cumprir com as normas cada vez mais rígidas de controle de emissões. A contrapartida é menor eficiência no aproveitamento da energia, pois o motor é maior, mas a moto anda igual.
Há mais de cem anos foi inventado o motor a combustão interna e a utilização de combustíveis fósseis parece que foi a solução mais eficiente que os técnicos encontraram para lhes dar energia. Essa forma de propulsão está se tornando ineficaz e trazendo consequências devastadoras ao meio ambiente. Desde as minas de carvão da Inglaterra, no começo da revolução industrial sabemos disso, mas pouco se fez para reverter a situação. Interesses comerciais foram mais importantes do que a sustentabilidade, mas agora é imperativo uma mudança. Os carros e motos elétricas podem ser o caminho, mas ainda precisamos verificar a mudança da cultura do motor a explosão interna com seu barulho (inspirador ou não) e emissões degenerativas ao meio ambiente.