De todos as marcas fabricantes de motocicletas presentes no mercado brasileiro, a BMW está no grupo daquelas que apresentam desempenho acima da média. E isso não se restringe ao último ano, mas desde que a marca decidiu iniciar a produção local, primeiro em 2009 na fábrica da Dafra em Manaus (AM), e mais recentemente, desde o final de 2016, em sua recém- inaugurada unidade fabril no PIM (Polo Industrial de Manaus) com a F 700 GS.

bmw_f700gs_28

Este bom desempenho é fruto de uma estratégia correta, que soube aproveitar a onda de crescimento dos segmentos premium (motos acima de 500 cc) para ampliar sua presença e ganhar espaço (e dinheiro). O crescimento (mundial) da marca foi vigoroso nos últimos anos, mas a forte concorrência deixou claro que se a Motorrad quisesse continuar crescendo, precisaria ousar um pouco mais. Então o grupo dirigente da empresa aprovou mais duas decisões igualmente estratégicas: lançar motocicletas menores para ampliar a base de clientes e ter uma boa base de produção em todos os mercados estratégicos.

Luciana: F 700 GS supre lacunas que a G 650 GS não atendia e a F 800 GS oferece a mais

Luciana: F 700 GS supre lacunas que a G 650 GS não atendia e a F 800 GS oferece a mais

Estas duas decisões se tornaram realidade rápido. A primeira já no final de 2015, com o anúncio da chegada da G 310 R, e em novembro de 2016, com a inauguração da fábrica BMW Motorrad em Manaus (AM). Enquanto a G 310 R e sua irmã G 310 GS não chegam, a BMW inaugurou sua produção no Brasil com a F 700 GS, moto que compartilha quase tudo com a F 800 GS, uma das motocicletas “best-seller” da marca no mundo. “Começamos com um produto cujo potencial já conhecemos e que é objeto do desejo de muitos consumidores que procuram uma bigtrail com perfil mais urbano e estradeiro”, fala a gerente de marketing da BMW Motorrad no Brasil, Luciana Francisco. Mais que isso, a BMW acerta também no momento deste lançamento, que reúne boas condições para abocanhar a melhor fatia do bolo das bigtrail de entrada, onde navegam em águas calmas as duas versões da Yamaha XT 660 e algumas outras, como a Suzuki V-Strom 650.

Bigtrail ou Crossover?

Antes de prosseguir, aqui cabe uma explicação quanto ao estilo desta motocicleta. Ela na realidade não é exatamente uma bigtrail, como são suas irmãs F 800 GS e R 1200 GS.  A grande questão é que a indústria percebeu que 90% dos consumidores que compravam as bigtrail as utilizam apenas para viagens longas ou passeios, quase sempre por bons e asfaltados caminhos. A preferência pelo estilo se dá em função do conforto oferecido tanto para piloto quanto para garupa e também pela versatilidade que essas motos permitem. Daí começaram a surgir motos com chassi e suspensões de bigtrail, mas rodas e pneus adequados para asfalto.

Aí estão as Kawasaki Versys 1000 e 650 cc, as Honda NC 750X e CB 500X, a Triumph Tiger Sport e agora esta BMW F 700 GS. A líder (do mercado) Honda deu o nome ao segmento de Crossover, seguindo a denominação que os fabricantes de automóveis adotaram para seus SUVs (Sport Utility Vehicles, Veículos Utilitários Esportivos), que há alguns anos eram todos jipões 4X4 e tinham pneus de uso misto, mas hoje a maioria dos SUVs são automóveis de passageiros com jeitão de jipe, pneus comuns e tração 4X2, isto é, crossovers. E nós vamos seguir com esta “sugestão”.

G, F, 650, 700, 800, que confusão!

Antes de seguir adiante e falar desta nova crossover, vale uma explicação sobre letras e números que a BMW utiliza na sua linha de motos. Para a BMW, as motos que tem “G” no início do nome, são equipadas com motor de um cilindro e as que tem “F”, vem com motor de dois cilindros. Você lembra quando existia a F 650 GS, que surgiu lá na virada do milênio (anos 2000-2001), que tinha motor de dois cilindros com 800 cc, mas que a BMW fez crer que era uma 650 cc? Pois é, essa moto fez muito sucesso e puxou a boa fama da família GS da marca até o surgimento de um 800 cc “de verdade”, a F 800 GS, que chegou em 2008. Com motores muito parecidos, a BMW decidiu produzir um novo motor de um cilindro (com parceria de um fabricante chinês), este sim com 650 cc, para equipar a nova moto, rebatizada de G 650 GS, tudo na mesma época do processo de nacionalização da produção da marca aqui no Brasil junto com a Dafra, em 2009. Entendeu? Espero que sim, porque eu fiz um grande esforço para entender como funcionou esse processo de batismo das BMW.

Agora surge este novo modelo de entrada da BMW Motorrad, que já está à venda desde o início de dezembro do ano passado, portanto há quase cinco meses nas concessionárias do País. Os primeiros números de vendas da nova moto – 155 unidades em pouco mais de 30 dias de 2016 e mais 210 nos primeiros quatro meses de 2017, média de 73 motos/mês – não empolgam e também não provam muita coisa, até porque o momento do mercado brasileiro ainda é de baixa, com vendas retraídas e muita desconfiança do consumidor. Só para comparar, a F 800 GS vende em média 138 motos/mês.

Apesar dos números de vendas ainda tímidos, no teste que realizamos a moto mostrou na prática que atende adequadamente quem deseja ter na mesma moto boa capacidade para múltiplos usos, seja no ambiente urbano, na estrada ou fora dela, com bom desempenho de motor, conforto para piloto e garupa e todos os itens de segurança e tecnologia que se exige para uma moto desta classe. Falando assim, até parece que a BMW F 700 GS é a verdadeira moto dos sonhos. Será?

bmw_f700gs_medidas

Não, a BMW F 700 GS não é a moto dos sonhos, nem a moto ideal e para alguns ela pode estar bem longe disso. Entretanto, ela oferece um “pacotão” que inclui características que lhe dão excepcional versatilidade e que por isso mesmo agrada a uma gama enorme de motociclistas. Isso ocorre porque ela foi pensada pela engenharia da BMW Motorrad para suprir as “deficiências” que a F 800 GS e a G 650 GS apontaram. E por isso, além das suas próprias virtudes, ela traz também a “correção” daquilo que nas outras duas é objeto de crítica pelos consumidores.

Excesso de vibração e falta de potência em uma e altura do banco na outra sempre foram as principais reclamações dos clientes que tem a G 650 GS e a F 800 GS, respectivamente. Aí ficou fácil definir uma moto que se adequasse perfeitamente a quem não queria comprar uma e tinha medo de comprar a outra, sobretudo porque, mantidas as boas características das outras duas, a BMW coloca na F 700 GS um grande potencial de venda, principalmente pelo bom motor, pelo pacote de segurança e pelo conforto e segurança de conduzir em função da altura do banco (820 mm) mais adequada à média dos motociclistas brasileiros.

Desligue ABS e controle de tração e divirta-se

Desligue ABS e controle de tração e divirta-se

Apesar de ser a partir de agora (e por enquanto) o modelo de entrada do portfólio da marca, a nova BMW F 700 GS tem preço “premium”, o que ela realmente é e entrega o que se espera dela. O motor é o mesmo da BMW F 800 GS, com dois cilindros e oito válvulas, DOHC, 798 cc, a gasolina, arrefecido a líquido, já muito testado e aprovado. Apesar dos 10 cv e 1 kgf.m a menos, este motor oferece 75 cv (a 7.300 rpm) e com torque máximo de 7,85 kgf.m (a 5.300 rpm), números suficientes para proporcionar excelente desempenho para todas as exigências normais, com respostas prontas e rápidas a qualquer pedida.

Consumo BMW F 700 GS

Distância (km)

Litros

Média

280,7 11,6 24,2
280,4 12,2 23,0
238,0 9,9 24,0
297,1 12,8 23,2
228,5 10,2 22,4

1.324,7

56,7

23,4

O bom consumo médio desta nova moto confirma seu direcionamento a um público que utiliza a moto de forma regular e em condições diferentes, mas que não colocam a esportividade como prioridade. Nosso teste foi realizado dentro das velocidades regulares tanto na cidade quanto nas estradas e também fora delas e até fomos um pouco além em alguns momentos, é verdade, para poder sentir o vigor deste motor. De fato, não há o que reclamar nem do desempenho, tampouco do consumo. Percorremos com a BMW F 700 GS 1.324 km e consumimos 56,7 litros de gasolina comum, ou seja, média de 23,4 km/l. E a tabela mostra que esse consumo não varia muito com diferentes tipos de pilotagem e ambiente, inclusive porque a moto foi utilizada por diferentes pilotos.

Longos trechos de estrada em boa velocidade: tranquilidade e conforto

Longos trechos de estrada em boa velocidade: tranquilidade e conforto

Não há muito a acrescentar para falar sobre chassi, freios e suspensões da nova BMW F 700 GS, exceto que a moto segue o mesmo padrão de excelência que a Motorrad oferece nas suas motos. Boa capacidade de absorção das irregularidades, apesar da suspensão com curso menor na dianteira – 180 mm – com roda de 19 polegadas. Mas a traseira é ajustável e sempre há uma posição adequada para qualquer perfil de piloto, carga aplicada e de pilotagem. Outro item que faz enorme diferença é a menor altura do banco, que agora é 7,5 cm mais baixa em relação à BMW F 800 GS, com 820 mm.

Caráter urbano, mas…

É claro que esta moto reúne em si algumas das características das bigtrail , mas seu caráter é urbano e estradeiro. Apesar disso, a F 700 GS enfrenta terrenos ruins com tranquilidade e até por ser mais leve permite mais controle em alguns momentos do que sua irmã maior. Percorremos vários e longos trechos off-road e a moto se saiu muito bem. A opção de desligar o controle de tração e o ABS, junto com a redução na pressão dos pneus, tornam a moto esperta para enfrentar trechos fora-da-estrada, apesar da roda de 19 polegadas na dianteira e dos pneus para estrada. Na verdade essa BMW superou todos os obstáculos mais comuns, como areia, pedras soltas e cascalho.

Porte, motor e chassi permitem bom desempenho em estradas ruins ou off-road; cuidado nos freios quando o ABS está desligado

Porte, motor e chassi permitem bom desempenho em estradas ruins ou off-road; cuidado nos freios quando o ABS está desligado

No uso urbano a moto se revela muito boa, com banco mais baixo e o torque do motor sempre presente com pouca rotação nas marchas mais baixas, uma ótima característica para enfrentar engarrafamentos e circular entre os carros parados. Em comparação com a F 800 GS, quase não se nota diferença e a roda menor na frente com o para lama mais discreto dão mais estabilidade. Ficou faltando apenas uma bolha um pouco maior para ficar mais confortável a condução na estrada.

Bem equipada

A F 700 GS tem uma longa lista de equipamentos que já saem de fábrica. Entre todos destacam-se os protetores de manetes, aquecimento de manoplas, controle de tração, ABS, cavalete central, sistema de monitoramento da pressão dos pneus, ajustes de compressão da mola traseira e de retorno do amortecedor traseiro e tomada 12 V no painel. Este, aliás, é bem completo e traz dois instrumentos arredondados e analógicos com o velocímetro e o conta giros, além de um mostrador multifuncional digital (LDC) com o marcador de nível de combustível no tanque e vários outros indicadores, como relógio, marcha engatada, temperatura ambiente e do líquido de arrefecimento do motor. Com o comando no punho esquerdo é possível mudar e percorrer para verificar outras informações disponíveis.

Painel cheio de estilo e com muita informação

Painel cheio de estilo e com muita informação

Há também as tradicionais luzes espia que indicam quase tudo, inclusive o mal funcionamento do sistema de escapamento, que na Europa é uma obrigação para atender a norma EURO4. Disponível nas cores cinza metálico e laranja, a BMW F 700 GS custa hoje (5/5/2017) R$42.832,00 (Tabela Fipe), enquanto que a irmã “maior” F 800 GS está na mesma tabela e na mesma data por R$44.320,00. Talvez esses valores expliquem um pouco dos números de vendas mencionados, onde uma vende quase o dobro da outra, apesar da enorme semelhança. Mas essa já é uma questão para a BMW resolver. Se você considerar que ambas são a mesma moto, só que uma está mais adequada para uso urbano e estradeiro enquanto que a outra também encara grandes desafios off-road, tudo fica mais claro.

Ficha Técnica BMW F 700 GS

Motor 2 cilindros em linha, arrefecido a líquido, 4 tempos, 4 válvulas por cilindro, DOHC, dois eixos de comando suspensos
Capacidade cúbica 798 cc
Lubrificação Cárter seco
Diâmetro X Curso 82 x 75,6 mm
Taxa de compressão 12,0 : 1
Sistema de partida Elétrica
Alternador Trifásico 400 W
Bateria 12V – 14 Ah
Sistema de Ignição Eletrônica
Tipo de combustível Gasolina
Capacidade do tanque de combustível 16 litros
Alimentação Injeção Eletrônica
Torque máximo 7,9 kgf.m a 5.500 rpm
Potência máxima 75 cv a 7.000 rpm
Transmissão 6 velocidades
Embreagem Multidisco em banho de óleo, com acionamento mecânico
Transmissão final Corrente
Tipo de chassi Tubos de aço treliçados; motor faz parte da estrutura
Pneu dianteiro 110/80 R19
Pneu traseiro 140/80 R17
Freio dianteiro Duplo disco de 300 mm com pinça dupla, ABS e acionamento hidráulico
Freio traseiro Disco simples de 265 mm com pinça simples, ABS e acionamento hidráulico
Suspensão dianteira Garfo telescópico com tubos de 41 mm de diâmetro / 170 mm de curso
Suspensão traseira Balança de alumínio monoamortecida com pré-carga de mola e retorno ajustável / 170 mm de curso
Comprimento total 2.280 mm
Largura 880 mm
Altura total (com retrovisores e para brisa) 1.215 mm
Altura do assento 820 mm
Trail 95,3 mm
Rake 64 º
Peso total admitido 436 kg
Peso em ordem de marcha 212 kg
Distância entre eixos 1.557 mm
Consumo (dados de fábrica / teste Motonline) 23,2 km/litro / 23,4 km/litro
Aceleração 0 – 100 km/h (dados de fábrica) 4,1 s
Velocidade máxima (dados de fábrica) 192 km/h

separador

 

Sidney Levy
Motociclista e jornalista paulistano, une na atividade profissional a paixão pelo mundo das motos e a larga experiência na indústria e na imprensa. Acredita que a moto é a cura para muitos males da sociedade moderna.