A região do Maciço de Baturité ocupa uma área de 3.750,1 Km² e encontra-se dividida em treze municípios: Acarape, Aracoiaba, Aratuba, Barreira, Baturité, Capistrano, Guaramiranga, Itapiúna, Mulungu, Ocara, Pacoti, Palmácia e Redenção.
Os cajueiros de Barreira
Convidamos os Águias do Apocalipse MC para nos acompanhar na nova rota, desta vez indo por Barreira – a Terra do Caju e que é a primeira cidade do maciço logo após o município de Chorozinho. Pegamos a BR116 e seguimos até Chorozinho e lá entramos à direita em direção à Barreira pela CE354. Barreira é uma cidade que vive do caju. É fácil perceber pois existem inúmeras florestas de cajueiros à beira da estrada.
Entre Barreira e Acarape existem as minas de calcário e de uma hora para outra o verde dos cajueiros cede espaço para o impecável branco do calcário. Passamos por dentro de Acarape e é preciso prestar bem atenção às placas para não errar o caminho da CE060. Em poucos quilômetros chegamos a Redenção – Terra da Liberdade. É lá que se juntam a CE354, a CE060 e a CE253, que é outra rota em direção ao Maciço, só que entrando por Pacajus, e a partir de Redenção segue-se até Pacoti e depois desce por Campos Belo em direção à BR020, e depois em direção à Fortaleza.
A Redenção que virou Vila
Foi em Redenção que em 1 de janeiro de 1883, chegaram à então Vila Acarape, abolicionistas como Liberato Barroso, Antônio Tibúrcio, Justiniano de Serpa, José do Patrocínio e João Cordeiro, com a finalidade de assistirem à alforria de 116 escravos do lugarejo. A partir daquele ato, em frente à igreja matriz local, não haveria mais escravos ali, ganhando a vila o nome de Redenção, pioneira em libertar seus escravos no País. Em reconhecimento ao fato de ter sido a primeira cidade do Brasil a abolir a escravidão, Redenção sedia a Unilab -Universidade Federal de Integração Luso-Afro-Brasileira desde 2009.
As primeiras comunidades da região do Maciço de Baturité se originam por volta da década de 1680, a partir da ocupação de pequenas aldeias. Contudo, as terras do Maciço permaneceram sem ocupação até 1718 quando o Tenente Coronel Manuel Duarte da Cruz ocupou parte da região que hoje é denominada Aracoiaba. Nas duas décadas seguintes foi tomada a parte poente da serra, hoje, conhecida por Aratuba. No ano de 1764, o ouvidor geral da Capitania do Ceará, Victorino Soares Barbosa, fundou a Vila Real, onde hoje estão os municípios da região do Maciço, com exceção de Palmácia e Ocara. O nome de Baturité – que significa Serra Verdadeira – só passa a ser adotado no ano de 1841 e, no ano de 1858, a Vila de Baturité passa à categoria de cidade.
Baturité – Começa a Serra Verdadeira
Chegamos a Baturité que é onde começa a ‘Serra Verdadeira’. Por causa do clima ameno e da água em abundância, Baturité e outros municípios vizinhos serviram de refúgio para sertanejos vindos de Canindé e Quixadá durante a Seca dos Três Setes (1777 a 1793). Um marco da presença católica no município é o grupo de igrejas, conventos e mosteiros que ainda resistem ao tempo e alguns deles convertidos em hospedarias.
Com a chegada dos pernambucanos, a região passa a cultivar a cana-de-açúcar e o café. Em meados do século XIX, Baturité torna-se o maior produtor de café do Ceará. O desenvolvimento da região acelerou com a instalação da ferrovia que ligava o Maciço à Fortaleza. Por ela os pequenos agricultores levavam sua produção para a capital. Tanto o Museu da Liberdade, em Redenção, como a exposição das obras de Olavo Dutra de Alencar que fica na Estação Ferroviária de Baturité e outros museus estavam fechados. Detalhe: era um domingo, teoricamente, dia de museu aberto.
Seguimos para a rota religiosa e rumamos pela estrada de pedra até a imagem de Nossa Senhora de Fátima exposta no alto do morro da Via Sacra – uma das maiores já construídas no mundo, perdendo apenas para a imagem de Nossa Senhora de Fátima existente na Praça 13 de Maio em Fortaleza. Subimos em três motos, mas é possível deixar as motos na cidade e enfrentar o caminho da Via Sacra Pública de Baturité com 365 degraus e que vai até onde fica a imagem da Santa.
A partir da imagem de Nossa Senhora de Fátima tem-se uma privilegiada vista da antiga Escola Apostólica dos Jesuítas, hoje popularmente conhecida como Mosteiro dos Jesuítas, onde funciona uma casa de retiros, encontros religiosos, congressos, hospedagem e até descanso. O prédio lembra um castelo medieval e é de uma beleza incomparável.
Do café a Mulungu
De lá seguimos para Mulungu. A estrada que liga Baturité a Mulungu, a CE356, se conecta em Aratuba com a CE257, que é outro caminho que leva à ‘Serra Verdadeira’ vindo por Canindé. Mulungu experimentou o desenvolvimento com a introdução da cultura do café. Famílias inteiras deixaram os sertões de Canindé e Quixadá para se estabelecer no alto da serra.
A Evolução natural do povoado determinou sua elevação a Vila e à emancipação de Baturité em 1890. O município de Mulungu foi extinto e recriado várias vezes até que a definitiva emancipação aconteceu em 1957. São Sebastião é o padroeiro e a estátua pode ser vista de qualquer ponto da cidade. Imperdível é visitar o distrito de Lameirão que fica na metade do caminho para Aratuba. Lá é possível ter uma visão de rara beleza.
O clima rural encanta e a paisagem deslumbrante de Mulungu convida a conhecer cachoeiras, trilhas e muito verde. Ainda é possível visitar engenhos. A melhor época é nos meses de maio a dezembro que é quando fazem a moagem da cana.
A Guaramiranga do ‘Pássaro Vermelho’ e do Festival de Jazz
Voltamos para a CE356 e agora rumo a Pacoti, passando por Guaramiranga.
Hoje o Festival de Jazz e Blues de Guaramiranga traz pessoas de vários lugares do Brasil e do exterior. Já passaram por aqui, nestes 16 anos, Hermeto Pascoal, Dino Rangel, Izzy Gordon, Traditional Jazz Band, Stanley Jordan, o grupo canadence Without Words, Renato Borghetti, Gilson Peranzzetta, Edu Negrão entre outros monstros sagrados do Jazz e do Blues.
Pacoti – ‘Voltada para o mar’
Era hora de pegar o caminho para Pacoti que significa ‘Voltada para o mar’. No caminho uma parada na Capela de Donaninha – Igreja de Jesus Crucificado. O que parece ser uma casa ou um mausoléu mal-assombrado é na realidade uma construção que representa uma bela história de amor entre o Comendador Ananias Arruda e sua amada Ana Custódio dos Santo, Donaninha. Casaram-se em Baturité (CE), em 17/09/1911.
A história de amor de mais de um século
Senhora Donaninha sofreu um infarto fulminante falecendo naquele local, em 1941, aos 46 anos de idade. O grande amor que tinha por Donaninha o fez erguer um monumento para que todos que por ali passassem lembrassem do grande amor que ele sentia por ela. Assim foi construída a Capela de Jesus Crucificado réplica da capela que existia na casa onde viviam em Baturité. A Capela contava com algumas imagens de santo que foram retiradas para evitar que fossem roubadas. As imagens se encontram em um museu de Baturité. Há um projeto (Proposta 1547476 número – 12823/2009) que pretende recuperar a capela em sua forma original e restituir ao local de origem as imagens e adereços da capela que se encontram depositados no Museu da Fundação Ananias Arruda em Baturité e ainda, transformar o local num centro de atração turística, porém o projeto originalmente orçado em R$ 174 mil reais e com a contrapartida da Prefeitura de Pacoti na ordem de R$ 3.560,00 está em análise desde 2010 sem nenhuma resposta por parte do Governo Federal e da Prefeitura de Pacoti.
O Comendador Ananias Arruda foi comerciante, agricultor, criador e jornalista. Não casou novamente, porém sua residência hoje foi transformada em um Museu pelo seu sobrinho Miguel Edgy Távora Arruda. Foi Comendador da Santa Sé, Ordem de São Silvestre, e também da Ordem de São Gregório Magno, pelo Papa Pio XII, a mesma Ordem a que pertence o Comendador Sucupira, meu saudoso avô. Ao Comendador Ananias Arruda foi dada pelo Papa Pio XI a autorização de manter no Oratório de sua residência o Santíssimo Sacramento, privilégio que foi renovado pelos Papas Pio XII, João XXIII e Paulo VI até a data de seu falecimento, que aconteceu em 1980 aos 94 anos de idade. Recebeu também autorização para dar comunhão. Como não tiveram filhos a herança passou para mãos de parentes que abandonaram aquele belo monumento. Quando passar por lá pare, desça e tire uma foto com a sua amada, pois ali está uma prova rara de amor eterno, pois o Comendador Ananias Arruda ficou viúvo até a sua morte.
As 380 curvas que levam a Palmácia
Chegando em Pacoti fomos ao K-Labar, já tradicional ponto de encontro de motociclistas que sobem a Serra Verdadeira e lá encontramos o Jan Messias, nosso companheiro de estradas e histórias e vários irmãos de Quixadá, Quixeramobim e dos Gaviões dos Monólitos de Quixadá. Almoçamos e depois era hora de descer.
Decidimos descer por Palmácia pela CE065 que passa por Maranguape, a Terra de Chico Anisio. São cerca de 380 curvas que não deixam você respirar e nem tirar o olho da estrada. Um descuido e você muda de faixa. Já o Rodrigo optou por descer pela CE253 em direção a Campos Belo pois iria pernoitar em Canindé. Tanto por Campos Belo como por Palmácia a emoção e a beleza estão contempladas. Se deseja uma rota linda de se ver e de fotografar opte por descer por Campos Belo via CE253. Se quer emoção e adrenalina, embarque nas 380 curvas da CE065 em direção a Palmácia.
O Maciço de Baturité é um lugar que vale muito mais que uma visita de um dia. Merece várias idas e vindas. Vale explorar, viver o lugar, afinal lá, além de ser a ‘Verdadeira Serra’ do ‘Pássaro Vermelho’ e ‘Voltada para o mar’ tem ainda uma grande história de amor e um superconcorrido Festival de Jazz e Blues.
Agende-se, pois todos os caminhos levam ao Maciço de Baturité.
Luis Sucupira é publicitário, escritor, jornalista, diretor e roteirista de cinema, tv e vídeo. Colunista dos sites Motonline, Motonauta, Revista Motoboy Magazine e autor do livro Guia do Motociclista Principiante. Um apaixonado por motos, história e, principalmente, por fazer amigos. Motociclista há 35 anos.
Texto publicado originalmente no site parceiro www.voceesuamoto.com.br