Por Jan Messias
A mata da caatinga se estende até onde a vista alcança, sendo interrompida pelas serras escuras ao fundo. A paisagem é desoladora pelos tons cinza da vegetação seca. No meio desse mar, eis que se eleva uma construção, o segundo andar de um sobrado em ruínas mostrando traços dos dias de glória do lugar. Estamos em Cococi, a 414 km da capital Fortaleza, hoje uma cidade fantasma, abandonada desde a década de 60, mas que foi palco do início da colonização da região dos Inhamuns, no Ceará.
A história de Cococi
Idealizada pelo Major Feitosa, o lugar foi habitado por centenas de famílias desde o século XVIII. Entre 1954 e 1968 foi um Município. Os moradores foram embora depois que um decreto do então Governo Militar rebaixou o lugar a distrito. Agora as casas estão em ruínas que guardam histórias incríveis contadas pelos que ainda moram no Cococi, um lugar assustador e deserto. A história por si só já é extraordinária, avassaladora como a paisagem do sertão. O município existiu por poucos anos e sucumbiu à descoberta pelo poder federal das irregularidades que nem eram tão diferentes das que aconteciam em outras cidades interioranas, mas Cococi foi a eleita para receber a exemplar punição.
A estrada para a cidade fantasma
Para chegarmos ao nosso destino, após a cidade de Tauá (CE), foi preciso enfrentarmos cerca de 61 km de estrada, 18 km de asfalto e o restante por estradas de terra, areia, pedras soltas e muita, muita poeira. Mas em nenhum momento os amigos do Moto Grupo Calangos dos Inhamuns, motociclistas que fizeram parte desta aventura, pensaram em desistir.
A vontade de conhecer Cococi vinha desde ter visto um documentário que mostrava o abandono do lugar. Aproveitei o convite de um amigo, membro do moto grupo, para acompanhar o batismo de um novo Calango, cerimônia feita na cidade fantasma.
Pegamos a estrada bem cedo, em um grupo com 10 motos, divididos em 2 pelotões para dar mais segurança e seguimos para a cidade. O trecho na estrada de terra foi o mais demorado e desafiador, já que, além das dificuldades da via tínhamos que ir parando para abrir as porteiras pelo caminho e passar por trechos de terrenos mais acidentados em uma estrada que não vê manutenção faz um bom tempo.
O casarão do Coronel Feitosa
Depois dos muitos quilômetros no sertão chegamos ao primeiro ponto de parada, o sobrado do Coronel Feitosa, uma construção imponente que se destaca mesmo de longe. A casa em ruínas ainda conserva muito da estrutura original, com um amplo pátio na parte interna e as ruínas do que era a senzala. Ao lado da casa, as ruínas de uma capelinha deixam a cena assustadora. Aproveitamos a parada no sobrado para reunir o grupo e descansar à sombra de uma árvore. Para chegar em Cococi ainda tinhamos mais dois quilômetros.
A cidade fantasma, cenário de uma história dramática
Chegando a Cococi o clima que se sente é de solidão. A única rua ainda demarcada é a central, onde as ruínas de um grande canteiro central onde as pessoas se reuniam. As engrenagens enferrujadas do que restou de uma bomba de água mostram o longo abandono. De um dos lados temos as ruínas dos prédios comerciais, onde, em alguns casos ainda se pode ser os letreiros, como no Hotel Novo Cococi.
O mato já invadiu tudo e é perigoso entrar, já que as estruturas estão muito abaladas. Do outro lado da rua temos ainda alguns sobrados abandonados e a Igreja de Cococi, restaurada, com um rico altar barroco, que recebe os fiéis durante a festa da padroeira, tradição ainda mantida e que reúne muita gente em dezembro.
Outro ponto de se visitar é o cemitério, próximo às ruínas, onde se pode ver os nomes que escreveram a história do lugar. O clima é estranho, um silêncio que incomoda, mas que vale a pena conhecer de perto para aprender sobre a poderosa passagem do tempo, transformando a glória em ruínas e a fama em esquecimento. Impossível voltar para casa sem refletir sobre o terrível destino de uma comunidade que um dia foi próspera e hoje está relegada ao esquecimento.
Onde fica Cococi?
Agradecimento especial ao Moto Grupo Calangos dos Inhamuns que me permitiram o privilégio de viajar em sua companhia.