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Foto: Comando OHC no cabe‡ote

Comando OHC no cabeçote

Dentro de um motor de quatro tempos há um relacionamento entre as peças, uma delas é toda especial. Na verdade, nada mais que um simples eixo de aço com alguns ressaltos (ou excêntricos), que fica girando enquanto o motor funciona. Sua importância é tão grande que essa peça recebeu um nome também especial: comando de válvulas.

Basicamente, o comando manda nas válvulas. É ele que diz o momento em que a válvula de admissão deve abrir para que a mistura combustível entre na câmara de combustão. Depois ele determina a hora em que essa válvula se fecha. Segue-se a explosão, e então ele comanda a válvula que permite a saída dos gases de escape, para em seguida ele comandar novamente a abertura da válvula de admissão do próximo ciclo.

Ciclo Otto: as fases de um motor de quatro tempos, Admissão, compressão, Expansão e exaustão

Ciclo Otto: as fases de um motor de quatro tempos. Na admissão (tempo 1) a mistura combustível entra no cilindro; na compressão (tempo 2) é preparada a ignição; a expansão dos gases (tempo 3) se inicia com a faísca da vela e empurra o pistão para baixo; na exaustão (tempo 4) se expelem os gases queimados

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Peça muito importante, o comando é um auxiliar do virabrequim que é quem vai levar toda força à sua roda. O comando auxilia na movimentação das válvulas que é quem permite o motor “respirar”. Ele está conectado ao eixo virabrequim de forma a determinar a posição exata na qual o pistão se encontra e nesse ponto, abrir ou fechar a válvula.

Cabeçote da Honda CB 500 - Duplo comando de válvulas (DOHC) acionados por corrente e quatro válvulas por cilindro

Cabeçote da Honda CB 500 – Duplo comando de válvulas (DOHC) acionados por corrente e quatro válvulas por cilindro

De forma prática, isso quer dizer que quando o pistão está em cima, no seu chamado PMS (ponto morto superior) pronto para começar a descer, a corrente que vem do virabrequim gira o comando e seu ressalto empurra a válvula que se abre, e a mistura entra na câmara de combustão, sugada pelo movimento descendente do pistão. Assim se inicia o primeiro tempo do motor de quatro tempos. Enquanto isso, o virabrequim continua a virar o comando até que acabe o ressalto e a válvula de admissão se fecha, pressionada pela mola de retorno.

No motor OHV as válvulas são no cabeçote e são acionadas por meio de varetas

No motor OHV as válvulas são no cabeçote e são acionadas por meio de varetas

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Assim que passa o ponto mais baixo do curso do pistão (Ponto Morto Inferior), o pistão já  começa a subir, comprimindo a mistura no segundo tempo do motor. O virabrequim posiciona o comando na hora de não mexer nas válvulas, as duas devem ficar fechadas porque o pistão sobe para comprimir bem a mistura. Surge então uma faísca na vela e uma explosão é o que sucede. Está se iniciando no terceiro tempo do motor, momento em que a explosão empurra  o pistão fortemente para baixo, gerando energia. Depois da missão cumprida, o pistão passa pelo PMI novamente e o virabrequim informa ao comando que a mistura queimada já  pode sair. Um outro ressalto do comando abre a válvula de escape, resultando no quarto tempo do motor, a exaustão. Assim, os gases queimados vão para o escapamento. Rei morto, rei posto. O comando abre a válvula de admissão e tudo começa novamente, no primeiro tempo da próxima explosão.

Tipos de comandos de válvulas no cabeçote: Dois comandos, um para cada operação nas válvulas é o que recebe a sigla DOHC - O que tem um único comando para as duas funções é o SOHC

Tipos de comandos de válvulas no cabeçote: Dois comandos, um para operar cada série de válvulas é o que recebe a sigla DOHC – O que tem um único comando para as duas operações é o SOHC

Esta explicação, embora correta, é simplificada. Existem centenas de sutilezas técnicas. Por exemplo, o comando não precisa ser movimentado apenas por uma corrente, podendo ser por engrenagens ou correias dentadas. Há ainda a questão de onde se coloca esse comando, se nas partes altas ou baixas do motor. Nesse caso, a movimentação das válvulas é transmitida por meio de varetas. Para cada sistema existe um nome: em praticamente todos os motores atuais as válvulas estão no cabeçote, determinando a sigla OHV (Over Head Valve), esses motores que utilizam essa sigla, em geral possuem o comando de válvulas nas partes baixas.

Para falar dos sistemas construtivos, existem várias formas de dispor o comando de válvulas. Motores OHV como os tradicionais das Harley-Davidson, têm suas válvulas acionadas por varetas. O SOHC – Single Over Head Camshaft (comando na cabeça) é o que equipa a grande maioria de motores de um único comando produzidos. A diferença entre um e outro é que o OHV não apresenta tanto rendimento como o OHC mas ele tem uma resistência verdadeiramente assombrosa devido ao fato de sua gama de rotação ser mais baixa.

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Os especialistas são mais dedicados, então existe ainda um outro sistema, que tem um eixo comando para as válvulas de admissão e outro para as válvulas de  exaustão. São os DOHC – Double Over Head Camshaft (duplo comando na cabeça), ele é usado em motos quando se deseja maior desempenho.

Além de variações de mapeamento da injeção eletrônica, uma das maiores diferenças entre um motor esportivo, desses de ir para a pista, e outro bem comportado de passear pela cidade, é justamente o comando. É ele que dá o perfil de um motor quatro tempos, a característica desse motor, em termos do tipo de entrega e qualidade de potência e torque.
A velocidade de abertura e fechamento das válvulas, o momento em que elas se abrem e fecham e quanto tempo elas ficam abertas. É claro que uma válvula de admissão aberta por mais tempo, permite que entre mais mistura de ar-combustível. Portanto, sairá da¡ uma explosão mais forte. Se explodiu mais‚ é óbvio que há  mais gases queimados e por consequência, a válvula de exaustão tem de ficar mais tempo aberta também. É ai que as coisas começam a complicar para os projetistas de motores.

Válvulas desmodrômicas têm comandos para abrir e fecha-las

Válvulas desmodrômicas das Ducati têm comandos para abrir e fechar

É verdade que a válvula demora algum tempo para abrir totalmente. Por isso, o comando deve começar o seu movimento um pouco antes do momento exato em que o fluxo de mistura deve passar para dentro da câmara de combustão. Assim também, a válvula de exaustão deve abrir um pouco antes do momento em que o gás passa pela válvula para que saiam todos os gases queimados e no fim, a válvula pode permanecer aberta até um pouco depois do PMI e isso normalmente acaba bem. Como a mistura ar/combustível ajuda a empurrar os gases queimados para fora, por ser mais densa, tudo fica mais fácil. Na realidade, os engenheiros estudam os movimentos dos gases nos dutos de admissão e escape, para otimizar as explosões e aumentar a potência. O volume, formato e comprimento dos dutos de admissão, até a ponta do escapamento são determinados por esse estudo para cada motor, e a consequência disso é a sua qualidade de potência, torque e eficiência no consumo de combustível.

O problema é que existe uma frequência ideal, determinada por uma rotação por minuto única, que corresponde a essa frequência de pulsos no fluxo de gás, especificada pela velocidade do virabrequim, em que essa “respiração” do motor se torna ideal, aumentando o volume para dentro e para fora da câmara de combustão. O grande desafio então, passa a ser o de distribuir a potência e torque do motor para todas as rotações em que o motor será usado.


Por exemplo: um comando esportivo é aquele que permite a um motor quatro tempos funcionar em altos regimes de rotações por minuto. Só que quanto maior a rotação, mais cedo as válvulas devem abrir e se fecharem depois, o que por consequência acaba por piorar a eficiência e desempenho em baixas rotações. Não se pode ter o melhor dos dois mundos. Mas então, entram nessa hora os comandos de tempos variáveis VVT como alguns da Honda e da Ducati. Eles permitem tempos conservadores de abertura e fechamento das válvulas para baixas rotações e assim que elas aumentam, há um avanço automático para que elas respondam também e tanto quanto melhor, nas altas rotações.

Outra questão é que não é fácil fazer com que as válvulas se abram e fechem no momento adequado em toda faixa de rotação. O que fecha as válvulas na maioria dos motores (exceto os desmodrômicos como os das Ducati) são molas e a partir de certas rotações o conjunto mola-válvula flutua, mais ou menos como se não fechasse nunca. Molas mais eficientes e válvulas mais leves resolvem o problema, assim como os comandos desmodrômicos, que possuem rampas para abrir e também para fechar as válvulas. Então, tecnicamente as válvulas desmodrômicas não flutuam, mas podem simplesmente explodir quando as peças superarem a rotação segura de trabalho, para a qual foram projetadas.

Uma forma de aumentar o volume e fluxo de gás nos motores é a utilização de mais válvulas. Usa-se três, quatro e às vezes até cinco válvulas por cilindro, aumentando assim consideravelmente a quantidade de gás para dentro e para fora da câmara de combustão.

Comandos de tempos variáveis já foram utilizados para aumentar a gama de rotações de um determinado motor. Na Ducati Testastretta há o sistema DVT de quatro válvulas de acionamento desmodrômico e variável, confira no vídeo.


Sistemas mais modernos estão a caminho. Na fórmula 1 por exemplo, as válvulas já são comandadas por sistemas pneumáticos que são gerenciados eletronicamente, sem correias ou correntes, nos tempos ideais que leva em conta a dinâmica das massas das válvulas e do fluxo de gás pelos dutos. Nesse caso, serão aposentados os tais comandos?

Bitenca
Pioneiro no Motocross e no off-road com motos no Brasil, fundou em 1985 o TCP (Trail Clube Paulista). Desbravou trilhas em torno da capital paulista enquanto testava motos para revistas especializadas.