Distante 162 km de Fortaleza está situado o município de Quixadá, que em Tupi significa “Bico da Arara”, uma alusão ao monólito em forma de uma “Galinha-Choca”. Mas essa formação geológica, resultado de milhões de anos de lenta formação, não é a única atração da cidade. Costumo dizer que em Quixadá a frase de William Shakespeare que diz que “há mais mistérios entre o céu e a terra do que sonha a nossa vã filosofia”, nunca caiu tão bem para definir um município.
Se você deseja mistérios há histórias de OVNIs por todos os lugares. Se buscar esportes radicais – vai saber que em Quixadá é onde foi batido o recorde mundial de voo livre. Mas não é só isso. Tem universidades, boa gastronomia, bons hotéis, muita fé e um visual que nos coloca, no meio dessa energia toda, em um misto de deslumbramento e mistério. Além de tudo isso, foi Quixadá a terra escolhida pela fortalezense Raquel de Queiroz para morar. Lá ela residiu no Sítio “Não me deixes” e de lá saiu para ser a primeira imortal da Academia Brasileira de Letras. Achou que só tinha Raquel de Queiroz? Então anota aí mais um – Jáder de Carvalho.
Açude Imperial do Cedro
Em Quixadá foi construído aos pés da pedra da Galinha-Choca o primeiro açude do Brasil- o Açude do Cedro – o qual foi a primeira de inúmeras tentativas para amenizar os efeitos da seca. A ordem de construção foi dada por D. Pedro II em decorrência do grande impacto social provocado pela seca de 1877 – 1879.
Se você pensa que Quixadá é só um lugar bonito para ir, ver e depois voltar para casa, vale lembrar que o município possui uma população de 83.990 mil habitantes, tornando-o o décimo município mais populoso do Ceará e o primeiro da Mesorregião dos Sertões Cearenses. Dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) de 2010 apontam que o município já teve o maior PIB do interior do estado, com um valor estimado em R$538.778,00.
Eu e meus irmãos do Anonymous MG montamos uma expedição composta de quase vinte motocicletas e mais seis carros de apoio para descobrir os mistérios, a cultura e os sabores de Quixadá. Seria um trabalho duro que não terminaria em apenas dois dias, mas traríamos, pelo menos, a ponta de um iceberg do sertão do Ceará. Os números dessa expedição dos Anonymous são expressivos. Foram mais de duas mil fotos registradas por cerca de quatro fotógrafos, dentre eles Marcelo Lira – parceiro que me ajudou a registrar aquilo que a atenção falhava.
Os 162 quilômetros são percorridos em estrada boa, dos quais, 86 deles em retas intermináveis. Ficamos hospedados no Hotel Vale das Pedras, antigo Hotel Municipal. Mas Quixadá tem ainda outras opções – uma delas – preferida pelos amantes de esportes radicais é o Resort Pedra dos Ventos que fica a pouco mais de 15 km de Quixadá no topo de uma serra no distrito de Juatama.
Ao chegarmos à cidade somos recebidos por uma estátua de um ET, que fica na entrada de um posto de combustível, cujos olhos, cintura e mãos estão envoltos em material reflexivo, o que, quando anoitece provoca muitos sustos nos viajantes por conta de “acender-se” quando iluminado por faróis. Mas não é de matar de susto e muito menos de morrer de medo; é apenas uma maneira bem quixadaense de receber seus visitantes, demonstrar a sua hospitalidade e, claro, dizer que ali costumam aparecer extraterrestres.
Antes de cairmos em campo fomos convidados a tomar um lanche na Moto Cedro – Concessionária Honda e mais uma vez a hospitalidade da população de Quixadá se fez presente. Fomos recepcionados por Sérgio Holanda com tudo que tem direito, até faixa de “boas-vindas”, tinha. Não precisa dizer que para um povo festeiro como o Anonymous isso foi motivo mais do que suficiente para começar outra festa.
Uma casa construída na pedra
Como tudo em volta de Quixadá está emoldurado por monólitos, era de se esperar que alguém tivesse a ideia de construir algo sobre alguma pedra grande. E assim foi feito por volta de 1919, quando, à época, o proprietário das terras onde hoje está uma praça que abriga a estátua de Raquel de Queiroz, o empreendedor Fausto Cândido de Alencar, resolveu construir uma casa sobre essa rocha.
Conhecida como o Chalé da Pedra, a construção é feita em estilo arquitetônico Art Nouveau e foi inspirada em outro casarão existente nas proximidades da barragem do Açude Cedro que havia sido planejado por Dr. Revy, engenheiro inglês que iniciou a construção daquele açude. O Chalé da Pedra abrigou também, secretamente, uma loja da maçonaria, pois era uma atividade proibida na época de Getúlio Vargas. A última reforma foi realizada para abrigar o Centro Cultural Raquel de Queiroz – onde funciona um museu da escritora e foi concluído e entregue em 2010.
Um santuário no lugar de uma capela
“Eu nunca imaginei construir uma capela, quanto mais um santuário”. Foram essas as palavras de Dom Adélio, envoltas numa humildade do tamanho da sua obra que ajudaram a construir o Santuário de Nossa Senhora Imaculada Rainha do Sertão. É um templo católico situado a 12 km do centro da cidade de Quixadá e está a cerca de 550 m de altitude, no Morro do Urucu. A mega-obra foi idealizada e construída pelo então bispo de Quixadá Dom Adélio Tomasin (hoje Bispo Emérito de Quixadá). Suas obras foram iniciadas em 1988 com a construção da estrada de acesso ao platô onde seria construída a igreja. Em 1993 foi colocada a pedra fundamental e em 11 de fevereiro em 1995 ocorreu a inauguração.
A primeira impressão para quem está indo pela primeira vez é esperar encontrar uma igrejinha pequena, modesta e que não foge do que se espera de uma construção assim. Mas na medida em que subimos temos a primeira surpresa. A cada curva surge uma escultura, propositalmente colocada no meio do mato, onde se vê a representação de cada uma das 14 estações da Via Crucis.
O clima de fé vai tomando conta do seu espírito e quando chega ao topo mais uma surpresa – o Santuário! Ele se descortina por sobre um morro de pedra onde é possível se ver além da cidade de Quixadá. A igreja do santuário mistura a devoção, a penitência e a busca. Em meio a todos encontramos fiéis, visitantes, beatas, padres e freiras. Nenhuma palavra, nenhuma foto é capaz de descrever a emoção de estar em um lugar coberto e carregado de tanta energia e beleza bem no meio do sertão. Junte-se a isso ver nos céus várias asas deltas planando na corrente de vento por sobre nossas cabeças.
Mas para quem não pensava em construir uma simples capela, Dom Adélio foi mais longe e fundou, também, a Faculdade Católica Rainha do Sertão que oferece 17 cursos dentre eles estão Arquitetura e Urbanismo, Biomedicina, Enfermagem, Engenharia Mecânica, Engenharia Mecatrônica, Farmácia, Fisioterapia, Odontologia e Psicologia. Agora, imagina se ele tivesse mania de grandeza? Quixadá que já foi distrito de Quixeramobim, hoje seria a capital do Ceará e teríamos um bispo governador.
Luzes estranhas no céu
Não existe nada mais sobrenatural que fotografar uma cidade numa época de seca que fazer isso exatamente no dia em que o sol resolveu esconder-se atrás das nuvens, molhar a gente e aumentar ainda mais o clima de mistério. A minha curiosidade sobre os OVNIs de Quixadá já era grande, bem antes do filme “Área Q”, que é baseado na história ainda inexplicável conhecida como o Caso Barroso.
A rotina do comerciante Francisco Leonardo Barroso, filho do agricultor que teria sido atacado por extraterrestres no sertão do Ceará nos anos 70 é uma das muitas histórias de contatos imediatos contadas na região. O agricultor Luis Fernandes Barroso, teria tido um contato bem próximo com os extraterrestres. Segundo relato, uma vez por semana Barroso ia para a fazenda olhar o rebanho. Saia de madrugada, por volta de duas da manhã. Um dia, quando voltava de carroça, ele disse ter tido contato com algo que “parecia um avião, mas que desceu, ficou perto dele e jogou uma luz muito forte, quase de cegar”, afirmou Barroso.
O Caso Barroso, ocorrido em 3 de abril de 1976, em Quixadá, Ceará, mostra a face terrível que pode se esconder por trás de suposto caso ufológico. Após o suposto contato ufológico, o protagonista, Luis Barroso Fernandes, apresentou uma estranha regressão mental, ao mesmo tempo em que sua pele rejuvenescia gradativamente. Após consultar 17 especialistas em várias áreas da medicina, seu caso permaneceu um mistério e serve de alerta para os riscos que podem se esconder por conta de um simples contato ufológico.
Mas não para por aí. Segundo o motociclista e ufólogo Arnoldo, dono de oficina e membro dos Gaviões dos Monólitos – MG de Quixadá, ele e sua mãe, hoje com 84 anos, presenciaram luzes no centro de Quixadá, que se aproximaram a ponto de assustá-los. Tais luzes foram vistas por toda a população. Em outro caso relatado por Arnoldo, uma criança de apenas seis anos à época (hoje com cerca de 13 anos) teve um contato tão próximo que ficou petrificada de medo sendo encontrada agarrada às grades do portão da casa onde morava.
Para Arnoldo, fatos como esses são muito comuns e já não assustam mais a população como há 20 anos. Hoje ninguém se importa muito. Já se sabe o que é e quem são. Simples assim. As aparições sempre acontecem em uma época do ano e geralmente ocorrem em período de estiagem e estão concentradas em locais que eles consideram como portais. Um desses locais é retratado no filme Área-Q. Se verdade ou não, o fato é que ninguém na cidade duvida. Todo mundo tem uma história para contar e fazem isso com a maior naturalidade possível, da mesma forma como estou agora contando um pouco da história de Quixadá.
Shakespeare jamais imaginaria que ao dizer que “há mais mistérios entre o céu e a terra do que sonha a nossa vã filosofia;” estaria ele se referindo a Quixadá. O mais impressionante é que a população gosta dessa relação com os ETs – e não é por questão turística – quase que da mesma forma que Raquel de Queiroz amava seu sítio chamado de “Não Me Deixes!”
É assim em Quixadá – você entra na cidade, envolve-se no clima de mistério, fé e de muita energia e no final em vez de um até breve, sai de lá como eu e os Anonymous saíram, com a sensação de “não nos deixe, Quixadá”.
Apoio Cultural – Moto Cedro (Honda) Quixadá; Custom & Race Moto Parts, Make Safe Alarmes Presenciais, Motonline e Motoboy Magazine.
Agradecimento especial: Casal Anonymous Juvenal e Carla Holanda.