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Uma cidade inimiga do motociclista se faz basicamente com a falta de atitude e não apenas com atitudes erradas. Fortaleza, no Ceará, é uma cidade assim – inimiga do motociclista. Nesta semana um protesto busca não apenas chamar a atenção, mas dar um basta neste descaso, que tem ceifado várias vidas diariamente.

MobUrb_3O sistema viário

Fortaleza tem umas das engenharias de trânsito mais criticadas do país. Além de ser o quarto pior trânsito do Brasil, a ‘Terra de José de Alencar’ padece de falta de cérebro para controlar o trânsito. Começa que os semáforos param de funcionar misteriosamente. No piso, além dos buracos, as motos têm que conviver com tachões que foram colocados para derrubar motocicletas e não permitir que elas circulem entre os carros, numa clara ação de desrespeito ao Código de Trânsito, que desde a gestão do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso deixa em aberto a opção de circular no corredor.

Não há fiscalização! O Departamento Estadual de Trânsito (DETRAN-CE) sabe a hora, o dia, o lugar, como, por quê e o que acontece em relação ao acidente de trânsito, mas não fez nada até que aconteceu uma mudança no governo e então decidiu usar estes dados. Sabem o que aconteceu?

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Redução de 60% das internações no Instituto Dr. José Frota (IJF) – Hospital de referência do Estado – por acidentes de trânsito envolvendo motocicletas, na Operação Retorno das Praias que o DETRAN-CE iniciou domingo, 22 de março. Quase 70 motocicletas foram apreendidas por estarem circulando irregularmente em via pública. No domingo anterior, 15 de março, o IJF fez 102 atendimentos relacionados ao trânsito dos quais 87 deles envolvendo motociclistas.

No domingo da primeira operação do DETRAN, o número de atendimentos no IJF por traumas de trânsito diminuiu para 53. Esse número representa 49 atendimentos a menos. O atendimento a motociclistas acidentados diminuiu ainda mais, para 35, que representam 52 a menos. A Operação Retorno das Praias infelizmente somente foi até 29 de março, com a abordagem exclusiva aos condutores de motocicletas. O Ceará registrou em todo o ano passado 732 mortes em conseqüência de acidentes com motocicletas e 5.109 internações, até novembro, pelo Sistema Único de Saúde (SUS). Se as autoridades sabiam de tudo isso e nada fizeram, qual a explicação?

Mas não termina aqui. Fortaleza virou a cidade da bicicleta. Nada contra. A moto era uma bicicleta antes de ser motocicleta, mas não se deve prejudicar um meio de transporte para dar espaço a outro. Criaram as ciclovias em ruas estreitas e para piorar, em avenidas da cidade, inseriram ainda faixas para ônibus e reduziram a distância entre veículos de forma muito perigosa e ainda inseriram as motos no congestionamento de trânsito que em Fortaleza bate fácil a marca de 160 km de vias congestionadas na hora de pico.

Mas tudo o que está ruim, pode piorar. Fortaleza não permite que mototáxis e motocicletas usem a faixa exclusiva de ônibus para ultrapassar os carros ou mesmo para escapar do engarrafamento em ruas e avenidas cujas reformas espremeram os veículos.

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Não há faixas de retenção – os famosos bolsões – onde as motos podem se agrupar para partirem rapidamente assim que o semáforo abre. As faixas de retenção conjugadas com o acesso vindo pelas faixas de ônibus são comuns em países de primeiro mundo. Cidades como Barcelona (Espanha), Londres (Inglaterra), no estado da Califórnia (EUA) e na cidade de São Paulo (SP) adotam este sistema, mas Fortaleza, não.

Tem bicicleta, ônibus, pedestre, trem e carro nesta campanha governamental. Mas cadê a moto?

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O homem

Os motociclistas do Ceará formam a terceira a maior frota de motocicletas da Região Nordeste. Segundo levantamentos do Departamento Nacional de Trânsito (DENATRAN) , a quantidade de motos do Ceará corresponde a 69,8% do total registrado em toda região Norte e a 62,4% das unidades do Centro-Oeste.

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A proporção entre motos e habitantes, no Estado do Ceará, é de um veículo para 7,9 pessoas. Já a média nacional é de uma moto para 10,57 habitantes. As duas maiores frotas do Brasil estão localizadas em São Paulo e Minas Gerais.

Porém, temos 300 mil pessoas circulando sem CNH e não se está falando aqui de ciclomotores, mas de veículos com RENAVAM. Vejam bem, sabemos onde, como, horários e porque acontecem os acidentes com motos. Agora sabemos quem roda sem CNH e sabemos também que mais da metade das motos roda com licenciamento vencido. Sabe-se de tudo isso e nada é feito. Minto – é feito sim. Pioram a via, encurtando-a. Não fiscalizam como deveriam e aumentam o DPVAT das motos por que elas caem muito. Ora, as motos no Ceará caem muito por que não se faz nada e o que se faz é para piorar o que já está ruim.

Para completar, os motoristas cearenses pagaram um valor superior a R$ 155 mil diariamente em multas de trânsito aos principais órgãos fiscalizadores do Estado, no ano de 2011. O montante arrecadado pelo DETRAN-CE, Polícia Rodoviária Federal (PRF) e Autarquia Municipal de Trânsito, Serviços Públicos e de Cidadania (AMC) ultrapassou a cifra de R$ 56,6 milhões. De lá para cá, ou seja, nos últimos quatro anos nada mais se soube sobre esse volume arrecadado a ponto do Ministério Público, este ano, ter sido orientado a investir os recursos com a arrecadação de multas de trânsito no setor.

O artigo 320 do Código de Trânsito Brasileiro (CTB) prevê os investimentos em sinalização, engenharia de tráfego, policiamento, fiscalização e ações educativas. Ainda na recomendação assinada pelos promotores do Núcleo de Atuação Especial de Controle, Fiscalização e Acompanhamento de Políticas do Trânsito (NAETRAN), Antônio Gilvan de Abreu Melo, Francisco Romério Pinheiro Landim, Edílson Santana Gonçalves e José Aurélio da Silva, o DETRAN deve se abster do uso dos percentuais elevados da arrecadação de multas em pagamento de diárias a servidores.

Demonstrativo da receita da Autarquia, de janeiro a outubro de 2014, não identifica o uso de recursos financeiros arrecadados com as multas nos meses de janeiro, fevereiro, março e abril. Nos demais meses, os valores aplicados foram imorais.

Nesta outra campanha, de novo, cadê a moto?

Nesta outra campanha, de novo, cadê a moto?

A Máquina

O DPVAT apena o motociclista ao cobrar um valor três vezes mais caro que o que se paga por um ônibus. Para se entender, a moto mata no varejo e o ônibus, no atacado.

Sabemos que 732 cearenses morreram em acidentes com moto em 2014, mas o DETRAN sabe que na Região Nordeste, apenas os estados de Bahia e Pernambuco contabilizaram mais incidentes do que o Ceará. Em média, o Ceará contabiliza, por mês, 25 ocorrências com coletivos nas estradas, incluindo os incidentes nas rodovias estaduais.

Os recursos do DPVAT são aplicados de forma ineficaz

As motos são penalizadas com valor extorsivo do DPVAT

No Brasil, o Rio de Janeiro vem em primeiro com 243 acidentes este ano, seguido por Minais Gerais, com 122 casos. Em 2014, o Ceará também teve o terceiro maior registro de acidentes do Nordeste. Os 321 acidentes contabilizados deixaram 21 mortos e 78 feridos.

Mas a moto ainda é o grande vilão! Vilão merece ser apenado e vem rapidamente, pois político não anda de moto, a classe A não usa moto para trabalhar, apenas para lazer. E assim, aumentar o DPVAT das motos melhora a arrecadação e tudo fica perfeitamente justificado por que acidente de moto custa caro, gera grande prejuízo e um exército de aleijados.

Ora, senhores, o DETRAN sabe a hora do acidente: quando, onde, como e por que. Ele também sabe que há cerca de 300 mil pessoas rodando de moto no Ceará sem CNH e que mais da metade das motos emplacadas no Ceará estão inadimplentes. O órgão arrecada dezenas de milhões de reais em multas, destinadas a resolver tudo isso. Ocorre que o DETRAN faz muito pouco, digamos quase nada, junto com a AMC (Autarquia Municipal de Trânsito) que nem efetivo tem, e faz com que estejamos entre os quatro piores trânsitos do Brasil.

É por todos esses fatos acima relatados que afirmo que Fortaleza é cidade inimiga do motociclista, por não fazer nada ou também pelo pouco que faz, somente piora a vida de quem anda de moto por suas vias.

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Luís Sucupira
Motociclista desde os 18 anos. Jornalista e apaixonado por motos desde que nasceu.