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Sem dúvida, as longas filas de “formiguinhas” circulando pelas artérias das cidades são parte de nossa civilização.

por M. Barthô

Desde a década de 80, no século passado, a motocicleta tornou-se parte essencial da vida nas cidades. A atividade profissional de serviços de “courier” – mensageiros, entregadores e carteiros — e o transporte de encomendas ou documentos de pequeno volume com o uso de motos, equipadas com um pequeno baú de carga — o motofrete — passou a ser feita em larga escala por um nova catergoria de prestadores de serviço — os motoqueiros/motociclistas conhecidos como motoboys. O serviço, que já se estende por todos os países do mundo, é essencial para o funcionamento economico das grandes e congestionadas metrópoles. Os motoboys estão nas ruas todos os dias. Com o passar dos anos, chamaram a atenção ou envolveram empresas, pessoas, autoridades de trânsito, motoristas, políticos, indústrias de motos, serviços de saúde etc.

Sobre ou uso profissional de motos, e especialmente sobre os cerca de 300 mil (por enquanto, ainda estimados) motoboys que circulam diariamente pela Grande São Paulo, o jornal New York Times, de influência mundial, já destacou o óbvio em um de seus artigos: se os motoboys pararem, São Paulo pára. Isso, a maioria – especialmente quem vive em São Paulo — já sabia. Mas a última novidade na área das motos equipadas para uso no motofrete é que seu uso e seus usuários, os motoboys, vêm sendo estudados por professores de renomadas universidades brasileiras.

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Maior volume diário Nem podia ser em outro país. O Brasil é onde motocicletas prestadoras de serviços mais atuam em volume diário dentro de uma organização, ou das tentativas de se estabelecê-la. Isso já está em curso, de forma espontânea: se olharmos lá do alto as artérias de uma cidade como São Paulo, vamos descobrir que as longas filas de motos circulando pelas avenidas e artérias assemelham-se a filas de formiguinhas em plena atividade.

Nos países do extremo oriente (como Vietnam, Cingapura, China e Coreia), as pequenas motocicletas e motonetas populares também são usadas aos milhões como veículos de transporte e para serviços. Mas por lá as coisas são literalmente escrachadas, ou caóticas: não há sinalização viária, todos rodam para todos os lados e os sorridentes motoqueiros de olhos puxados pilotam calçados de chinelas. Por lá ninguém usa capacete e as motonetas oupequenas motos levam várias pessoas e crianças, frangos, gansos, peixes, escadas, móveis, porcos engaiolados etc.

Infelizmente, e devido ao grande volume de pessoas procurando obter com as motos seu pão de cada dia, o Brasil também é o pais onde os motoboys, ainda estãoem fase de organização. Só muito recentemente a segurança, as normas legais para a atividade e os benefícios trabalhistas começaram a ser aplicados ao motofrete. O que piora o assunto é a leva de de políticos e candidatos a políticos, além de “otoridades” de todos os níveis, caindo de boca sobre a motoqueirada para arrumar a vida. Esse flagrante é típico do subdesenvolvimento cultural.

A maioria desses tipos inescrupulosos jamais pilotou uma motocicleta ou, com toda certeza, nunca caiu de moto. Na melhor das hipóteses, muitos dos que pilotam suas importadas em volta do quarteirão nos finais de semana (vejam: não são todos!) apenas fingem que usam motos. Na verdade, durante a semana esses tipos usam os motoboys que estão ralando ou morrendo nas ruas e avenidas. Vez por outra, à noite, chamam uma pizza em casa. E quem entrega a pizza é um daqueles indigestos motoboys.

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Essa dose de hipocrisia contra a utilidade das pequenas motocicletas atinge até mesmo um brilhante e inteligente apresentador de TV, ex-motociclista, que usa seu poder de opinião e sua inteligência para execrar as motos em rede nacional. Mas, até mesmo ele, que apesar de talentoso é leviano nesse ponto, precisa dos motoboys para levar seu programa ao ar diariamente.

Vamos lá: em vez de meter o pau e virar as costas para os problemas enfrentados pelos motoboys, essa raça “mardita” mas essencial, como a maioria faz, por quê não buscarmos maneiras mais viáveis de usar ou integrar o uso profissional das pequenas motos ao dia-a-dia?

Nesse ponto, o aparecimento de estudiosos sérios, oriundos de universidades de expressão, debruçados sobre o estudo as motos usadas para motofretes e seus usuários é extremamente salutar. Sem dúvida, um estudo desse nível resulta em melhores soluções para diminuir as notícias matinais diárias sobre os enormes congestionamentos causados devido a um motoqueiro arrebentado e esticado no asfalto.

Enfim, o maravilhoso estudo universitário de Eugenio Paceli Diniz ( [email protected] ), divulgado a seguir, ressalta exatamente isso: que a presença das motocicletas prestando serviços já é parte integral da vida cotidiana dos grandes aglomerados urbanos de nossa civilização.

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E vamos à tese O dr. Koshiro Otani ([email protected]), médico especializado em questões trabalhistas, enviou a este Motonline o trabalho academico de Diniz, que está sendo desenvolvido na Universidade Federal de Minas Gerais. Dr. Otani

“Repercuto o trabalho que me foi enviado pelo próprio autor, Eugenio Paceli, pesquisador da Fundacentro, entidade da Universidade Federal de Minas Gerais, a propósito da matéria que lhe enviei sobre os motociclistas e motoboys”, diz ele. A matéria original, onde o Dr. Otani dá seu depoimento, saiupublicada originalmente no Motonline e pode ser relida.

A respeito da tese que segue, Otani comenta que “trata-se de um excelente guia que orienta os segmentos que estão envolvidos com os serviços prestados pelos motofretistas”.

O trabalho universitário, uma tese baseada em extensa e valiosa pesquisa, é intitulado “Motociclistas Profissionais: Entre as Exigências de Tempo e os Constrangimentos do Espaço”. Seu autor destaca todas as fontes em que bebeu suas informações para compor e defender seu estudo. Elas são acessíveis de acordo com os ícones destacados pelo próprio nos parágrafos abaixo.

Vale a pena ler. A tese segue exatamente como o original enviado.

I – AS CONDIÇÕES ACIDENTOGÊNICAS E AS ESTRATÉGIAS DE REGULAÇÃO DOS MOTOCICLISTAS PROFISSIONAIS: ENTRE AS EXIGÊNCIAS DE TEMPO E OS CONSTRANGIMENTOS DO ESPAÇO

Autor : EUGÊNIO PACELI HATEM DINIZ [email protected] Universidade : UNIVERSIDADE FEDERAL DE MINAS GERAIS Área de concentração : DINÂMICA DOS SISTEMAS DE PRODUÇÃO Orientador (es) : Profª Dra. Ada Ávila Assunção e Prof. Dr. Francisco Antunes Lima Data da Defesa : 2003 Resumo : A prestação de serviços de motociclistas profissionais constitui o foco investigativo deste estudo, que visa atender a demanda formulada pelo sindicato dos trabalhadores, bem como encontrar elementos que subsidiem os atores sociais nas negociações relativas à melhoria das condições de trabalho da categoria. Para tanto, procurou-se desvelar a atividade dos motociclistas profissionais e os reflexos da organização e das relações do trabalho sobre as estratégias e os modos operatórios implementados pela categoria. Para compreensão da atividade, adotou-se a Ergonomia, como metodologia de pesquisa, e seu método de ação – a Análise Ergonômica do Trabalho. Os dados empíricos foram obtidos de observações e filmagens no trânsito, numa empresa de Belo Horizonte/MG e noutra de Uberlândia/MG. Oitenta e cinco motociclistas profissionais foram entrevistados e tiveram as suas atividades observadas e autoconfrontadas. Procedeu-se também ao estudo e à autoconfrontação das rotas elaboradas em mapas por vinte e quatro motociclistas profissionais. Os resultados revelaram que a organização e as relações do trabalho das empresas prestadoras de serviço de motociclistas profissionais são determinadas pelas novas relações inter-empresas. Os clientes exigem um atendimento pontual, rápido e de confiabilidade, não levando em consideração que as atividades imateriais e materiais são indissociáveis. Com efeito, os motociclistas profissionais se encontram submetidos a elevadas demandas de serviços e a intensa pressão temporal. Para satisfazerem as exigências de tempo dos clientes e enfrentarem os constrangimentos do espaço, os motociclistas profissionais encontram no coletivo de trabalho, no planejamento temporal e da rota, a solução para atender aos objetivos da produção e garantir a sua sobrevivência. Inúmeras estratégias e modos operatórios foram desenvolvidos e colocados em prática pela categoria nas repartições, no trânsito, nos clientes e nas empresas pesquisadas. A análise da atividade mostrou os motociclistas sob uma ótica produtiva, garantindo o compromisso entre a produção e a segurança. A partir daí foi possível elaborar vinte e cinco sugestões para que os atores sociais envolvidos no processo Saúde & Trabalho possam iniciar as negociações. Espera-se que essas sugestões, uma vez implementadas, possam reduzir os indicadores de morbimortalidade e reverter a percepção estigmatizante da sociedade em relação a essa classe de trabalhadores.

II – Recomendações Técnicas Para a Prevenção de Acidentes no Setor de Motofrete

Autor (es): Eugênio Paceli Hatem Diniz et alli Resumo : As recomendações técnicas constantes nesta publicação fundamentam-se numa Convenção Coletiva de Trabalho que, por sua vez, norteou-se em pesquisa realizada pela Fundacentro. As recomendações cobrem vários aspectos determinantes do comportamento dos motociclistas profissionais, das relações contratuais às relações com os clientes, passando por medidas de reorganização das vias de trânsito. Dessa forma, espera-se que esta publicação constitua não apenas fonte de consulta para elaboração de outras convenções coletivas de trabalho, mas principalmente um embrião de futuras legislações, seja no âmbito federal, estadual ou municipal, para o setor de motofrete, de forma a reverter o quadro de acidentes graves e fatais e os conflitos no trânsito. Antes das recomendações técnicas propriamente ditas, faz-se na introdução uma abordagem compreensiva a respeito dos acidentes.

Ano : 2006 Número de páginas : 60 III – Guia de Orientação aos(às) usuários(as) dos serviços de motofrete

http://www.fundacentro.gov.br/CTN/anexos/guiaMotofreteParaWeb.pdf Autor: Eugênio Paceli Hatem Diniz Resumo: Este guia apresenta informações práticas aos usuários dos serviços de motofrete, seja na condição de pessoa física ou jurídica, que podem contribuir para uma convivência mais harmoniosa no trânsito e para que sua solicitação seja atendida dentro dos limites possíveis. O guia apresenta também orientações às pessoas na condição de pedestres e/ou motoristas, de como podem proceder para evitar acidentes com os motociclistas na vias públicas.

IV – Revista Brasileira de Saúde Ocupacional

Vol. 32 Nº 115 – Jan-junho 2007 Acidentes de trabalho e sua prevenção divulgada originalmente em Motonline Leiam a matéria completa que deu início a essa valiosa troca de informações em: http://www.motonline.com.br/forum/forum_posts.asp?TID=8951&PN=1&TPN=1