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A Harley se concentrou em transformar sua marca em um ícone, um símbolo de liberdade aliando o estilo clássico americano com relativa modernidade em seus modelos. Quem conhece Harley sabe como elas evoluíram na última década perto do que eram nos anos 80.

O novo motor TC96, uma surpresa escondida até o último momento

A concorrência obviamente se mexeu. Se no início da nova onda “custom” as japonesas se contentaram em fazer motos como a Virago e alguns modelos Shadow VTX pequenas, com estilo mais “chooper”, de um tempo pra cá os modelos chamados pelos americanos de “Metric Cruiser” (por divulgarem a capacidade de seus motores em centímetros cúbicos, o sistema métrico, e não em polegadas cúbicas como é comum por lá, pelo sistema inglês) passaram a incomodar a fabricante de Milwaukee e até os mais puristas foram obrigados a reconhecer a qualidade de alguns modelos nipônicos.

Se no final do século passado (parece que já foi há tanto tempo…) motos como a Yamaha Royal Star e seu motor V4 refrigerado a água ou a Honda Valkyre de 6 cilindros também a água (o mesmo da Gold Wing) de 1800cc empolgaram os americanos, a onda hoje são os grandes big twins onde até então a Harley reinava sozinha.

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Vejamos: A Yamaha lançou a linha Stratoliner, bem no estilo Low Rider das Harley, com motor de 113cu (cubic inches, ou 1850cc), um V2 refrigerado a ar com muita potência e torque em baixas rotações que também equipa as Roadliners, com estilo mais retrô. Para a linha “intermediária” há o motor de 103cu (1670cc) com a mesma configuração V2 equipando a linha RoadStar. Na linha “popular” a nossa conhecidíssima V-Star (aqui no Brasil, DragStar) além da tradicional 650 e 1100 recebeu um motor maior, agora com 1300cc.

E a Honda? Além da Gold Wing (6-boxer 1800cc) vendida no Brasil, a linha “cruiser” tem um fantástico motor V2 de 1800cc equipando a bem sucedida linha VTX com modelos em todos os estilos.

A Suzuki também cresceu seus modelos e além da nossa conhecida Boulevard 800 e 1500 há a nova Boulevard M109R (1790cc) que anda fazendo um bom sucesso nos EUA. A Kavasaki, para não esquecermos dela, também tem modelos Vulcan com motores V-Twin de 2000cc e 1600cc, e não podemos esquecer a Triumph Rocket com o incrível 3 cilindros em linha de 2400cc. Um detalhe que eu esqueci de dizer: a Harley é a mais cara de todas, e a que tem o motor menor, de apenas 1450cc.

“Houston, we have a problem!”

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Americano adora potência bruta, são fãs de Drag Racing e de motores V8 mas a sua “marca oficial” de motos, a Harley, ficou pequena com seus míseros 1450cc (o conhecido Twin Cam 88, de 88 polegadas cúbicas). Mesmo oferecendo upgrades para 95cu e 103cu (respectivamente 1550 e 1670cc) realizados diretamente nas concessionárias, apesar do alto custo e da perda da garantia dependendo da configuração utilizada, a concorrência não estava mais brincando e começou a tomar o espaço cativo da Harley.

O clássico kit “big bore” de 103cu, reparem que agora não inclui mais o virabrequim, que passa a ser de série.

Mas o problema não parava só potência, pois é obrigatório enquadrar qualquer motor de série dentro da restritiva regulamentação da EPA (Environmental Protection Agency) que atua desde a queima de combustíveis fósseis, que incluem automóveis, motos e caminhões, até a reciclagem de produtos que afetam o meio ambiente como baterias, monitores de vídeo, etc. Com isso, o motor TC88 lançado no século passado com uma tecnologia bastante ultrapassada vem recebendo modificações tão restritivas para se enquadrar a tais normas que acabaram por afetar seu desempenho e o tradicional som do escapamento, marca registrada da marca.

Esse problema não é novo, e o motor V2 refrigerado a água desenvolvido junto com a Porsche, que hoje equipa a linha V-Rod foi pensado para resolver esse problema e atende as normas da EPA, mas nesse momento ele só tem 1200cc e não tem agradado os americanos. Lá as V-Rod são muito mais baratas, por falta de demanda, que os modelos V-Twin clássicos, enquanto que aqui no Brasil e na Europa é ao contrário.

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Nos últimos meses muito se especulou quais seriam as modificações no motor da Harley, e até mesmo se elas chegariam agora ou só em 2008. Especulou-se até em uma linha Touring completa com o motor da V-Rod, mas acho que os americanos ainda precisam digerir melhor essa idéia. A solução até que foi simples, ao invés de equipar os motores TC88 com o kit de pistões do TC95, de forma simplificada podemos dizer que usaram o virabrequim do kit TC103, com mais curso, mantendo o pistão original do TC88. Resultado: assim nasceu o TC96 que equipa todas as Harley a partir desse ano com exceção da linha Sportsters.

O novo virabrequim do TC96, com curso mais longo, fazia parte do kit 103cu antigo.

A Electra Glide Ultra Screaming Eagle, uma das varias CVOs de 2007

As informações que obtive dão conta de mais de 300 modificações foram feitas para que o motor atendesse as normas da EPA, tivesse confiabilidade e permitisse upgrades para 103cu (basta agora utilizar o velho kit de pistões do TC95, já que virabrequim tem um curso maior) e para 110cu utilizado nos modelos CVO (Custom Vehicles Operations, a linha Screaming Eagle customizada de fábrica). Com o TC96 houve um incremento de 17% no torque máximo, ainda obtido em baixa rotação (em torno de 3.500rpm, ou menos, dependendo do modelo) e com ele são agora instalados o cambio de 6 marchas com a sexta “overdrive”. A 120Km/h as rotações do motor ficam em torno de 2800rpm.

Também foi feito um trabalho nos escapamentos e o som voltou a agradar, apesar do catalisador, segundo depoimentos dos usuários e entrevistas do pessoal da Harley. O preço final do produto aumentou muito pouco, coisa de 3% em média. Até o momento parece tudo muito legal, não é?

Mas não, ao que tudo indica o TC96 é transitório até a solução definitiva baseada em um completo redesenho do motor. A Harley não divulga a potência do novo motor, mas já se sabe que é praticamente a mesma do TC88, e por isso inferior às das japonesas. O maior torque é bem vindo, mas o cambio ficou mais longo e isso não agrada a todos. Não dá pra usar a 6ª marcha a menos de 90 por hora, por exemplo. A impressão que ficou é que, apesar do bom trabalho, o TC88 de 2006 modificado para TC95 é ainda mais forte e tem mais torque do que o TC96 de 2007 simplesmente porque ele é menos “travado” de fábrica.

Outro agravante, e para vocês compreenderem eu sugiro que leiam minha coluna anterior Injeção é Moleza! onde falo sobre as inúmeras regulagens que são possíveis em uma injeção eletrônica. Por força da EPA, a nova injeção de circuito fechado (sensor no escapamento, correção automática) não permite muitas estripulias, e a tendência é que as motos não tenham mais a sua mecânica modificada. Aliás, agora a quebra de garantia é bem explícita, e quem modificar que se entenda com a EPA na hora da vistoria.

Na minha opinião as novas Harley vão agradar muito nos mercados internacionais (Europa, Japão, Ásia e América do Sul), mas os americanos gostam de mexer na moto, especialmente no motor, e era isso que diferenciava as Harley das demais japonesas. Nos fóruns da marca, a preocupação é crescente nesse sentido pois tem muita gente que já pensa em comprar uma japonesa mais barata, que vibra menos, é mais potente, tecnologicamente mais avançada e mais econômica, ao invés de comprar uma Harley “careta”.

A nova V-Rod Night Rod Special. Não entendo porque os americanos não gostam tanto da V-Rod quanto das V-Twins clássicas

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